sexta-feira, dezembro 28, 2007

FELICIDADE

No artigo “Uma Definição de Felicidade”, Stephen Kanitz (Revista VEJA de 22/06/2005) só falta dizer que em termos de relação amorosa é impossível ser feliz sem sofrer muito ou pouco, sempre ou de vez em quando. Mas deixa implícito que ninguém deve ir ao pote com sede demasiada, sabendo que ele é mais de barro do que o ser humano e, portanto, ainda mais quebrável. Sabiamente ele recomenda determinar sempre “a distância certa entre o que se tem e o que se quer ter...: uma distância nem exagerada nem tacanha”. Temos que saber ir, saber parar e até mesmo retroceder, às vezes. O afoito pode até conseguir bons momentos, mas pode cansar e causar maus momentos à outra pessoa. Ninguém é de ninguém, na vida tudo passa, como dizia a canção de Moacir Franco. Para ser livre, você tem que abrir os braços e dar liberdade a quem ama, ou seja, uma licença feliz na reciprocidade. “O casamento, no seu significado usual repugna-me”, diz Birkin a Gerald (personagens de D. H. Lawrence do romance “Mulheres Apaixonadas”). Comparado com ele, o egoismo a dois não é nada. É uma espécie de caçada feita por grupos de dois; o mundo todo aos pares, cada qual na sua casa, tratando de sua vida, cozinhando na intimidade.... Nunca vi coisa mais repelente sobre a face da terra”. Mas não há outra alternativa, e é preciso encontrar uma, os amigos concordam, desolados. Tenho certeza que a significação dos termos infidelidade e traição conjugais precisam ser revisados à luz de uma nova e melhor salubridade mental. Sabemos que os aparelhos sexuais masculinos e femininos de todos os seres vivos são espertos e estão para o que der e vier, como lá diz o chavão popular: “lavou está novo de novo”.A liberalidade sem a predisposição da censura social, judicial, moral, e despida de estúpidos exageros da libertinagem (descompostura,exibicionismo, assédio, estupro) é o perfeito sinônimo da secularmente decantada liberdade, sonho mais antigo da vivência humana. D.H.Lawrence ficou famoso quando publicou na Inglaterra seu belo romance “O Amante de Lady Chatterley”, otimamente refilmado agora na França. Na opinião dele todas as mulheres são apenas uma, a mesma de sempre. A esposa nem precisa enciumar-se. O que atrai o marido nas outras é algo que flui e reflui dela – pois sempre amou e amará apenas uma nos melhores momentos de cada uma. Resta saber se a reciprocidade é cabível. Todos os homens são o mesmo para cada mulher? Eis aí uma indagação considerável. Dá até sentido prático à declaração de Gerald a Gudrun: “se você não vivesse neste mundo eu não viveria também”. Infelizmente a sociedade humana estabeleceu outro código de convivência, indignando tantas pessoas de ambos os sexos, cerceadas nas intenções e nos sonhos de uma felicidade amorosa que, como disse, só se possibilita através do sofrimento. John Lennon em uma de suas melhores canções, replicou idoneamente, em fina e arguta sonoridade: “fizeram a gente acreditar na fórmula chamada “dois em um”: duas pessoas pensando e agindo igualmente sem nos contarem que onome disso é anulação, e que os indivíduos de personalidade própria podem ter relações saudáveis”.Falou com outras palavras, musicais, é claro.Na verdade, como está circulando no correio eletrônico, a liberdade pode ser nome de rua, de poema, de sonho, de conquista, mas é bem mais do que tudo isso quando rima com a realidade.