BRASIL 1808 – 2008
A figura de D. João VI, muitas vezes destratada pelos historiadores, bem que merece uma reavaliação reabilitadora. Ele foi o único monarca europeu que, na época, conseguiu enganar a prepotente perspicácia de Napoleão: se não trouxesse o Governo para o Brasil seria preso pelos invasores e Portugal e todas suas colônias seriam anexados à França. A evidência é que Napoleão tinha os olhos maiores do que a barriga ao tentar recapitular os áureos tempos do fabuloso império romano. Como acentua Laurentino Gomes no livro “1808” (Edições Planeta do Brasil, SP, 2007): “Não havia alternativa: ou a família real fugia para o Brasil ou seria destronada”. Assim, continua o autor: “Os navios portugueses ainda estavam à vista no horizonte quando as tropas francesas começaram a entrar em Lisboa”. Assim a conquista napoleônica não aconteceu: como apossar-se de um território cuja administração mandatária tinha trocado de endereço? Assim, a fixação do governo no Brasil engrandeceu os brios da nacionalidade, fazendo do dele a sede de um aglomerado de colônias, o que coroava em termos estatísticos “uma das maiores movimentações forçadas de pessoas em toda a história da humanidade”, pois a descoberta do ouro e do diamante das Minas Gerais já tinha trazido mais de 800.000 portugueses e mais de dois milhões de africanos cativos, transformando uma população de trezentos mil “da última década do século XVII para mais de três milhões por volta de 1800”. Na parafernália da Vinda, Chegada e Assentamento, os colonizadores ficaram perdidos que nem cegos em tiroteios (como se diz), transidos no meio de infindáveis problemas de toda ordem. Foi aí que a onda de corrupção dos relapsos avolumou de tal maneira que enlameia até hoje os quadrantes nacionais, que até hoje não conseguem estabelecer uma elite política duradoura, que possa organizar e administrar a nação de forma limpa e rentável. Nelson Werneck Sodré, em “As Razões da Independência”, cita as quadrinhas populares que celebrizavam as roubalheiras: “Quem furta pouco é ladrão/ Quem furta muito é barão/ Quem mais furta e esconde/ Passa de barão a visconde./ Furta Azevedo no Paço/ Targini rouba no Erário/ E o povo aflito carrega/ Pesada cruz ao Calvário”. É assim que hoje constatamos, sofridos e pesarosos, que um País sem uma elite política não funciona eticamente: marca-passo ou retrocede. A elite (está no Aurélio) etimologicamente, “é o que há de melhor numa sociedade: o escol, a flor” – e não a espúria interpretação lulista de classe social privilegiada. A verdadeira elite arca com o ônus para resolvê-lo e não para criá-los e recriá-los indefinidamente. Estamos cansados de saber que a Política de nosso País sempre foi paupérrima em se tratando do vigor da autêntica ELITE, uma vez que a melhor parte de nossa sociedade não encontra entrada nem apoio no quadro suspeito da suja politicagem do secular (des)mando nacional (com raríssimas exceções de períodos e de integrantes eticamente corretos e saudáveis). Nossos Colonizadores. Vieram do lixo com o lixo para o lixo provaram do fel a ruindade comeram do cru e do putrefato tornaram-se piores do que eram mas assimilaram das manhãs a suavidade dos cantares da mãe natureza enfrentaram o desafio de cada dia a aspereza da resistência indubitável da mãe natureza burilaram o que se desprendia das arcadas sujigaram o dúctil a seu alcance embalados pelos cantos e recantos dos pássaros e das ninhadas inconscientes do desagrado que estariam causando a Deus e a Todo Mundo. Vendo hoje na lisura do ar e das paredes as imagens e os sons as cornucópias os meliantes os corruptos os traficantes nas mesmas dimensões e regalias das comendas desonradas lembramos cansados de tantas leréias parvas e dolorosas nuas e cruas ou mal-passadas que já vimos esses filmes de ações nefandas em telas de infeliz memória em letras de infeliz inglória.
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