DIA E NOITE
O bando de capivaras no relvado da beira do rio:
o dia inteiro sem proferir uma palavra.
“Já estamos conversados”, cada uma diz,
no interminável diálogo lá delas,
que para nós é satisfatório silêncio.
Varrendo as folhas das árvores do passeio de sua casa,
o idoso é interpelado pelos passantes da rua:
“a folhagem não dá trégua, heim?”
Ele ri amarelo,
aceita a pergunta sem responder.
Sabe que cada uma das folhas é uma palavra de Deus,
a ele remetida em todo santo dia,
em forma de álacres bilhetes
da fértil imaginação cósmica.
Depois de ler e curtir centenas de escritores
(alguns talentosos, outros geniais),
sinto-me livre de todos eles,
sabendo
que nada estou a dever a nenhum deles,
e que agora
estou apenas comigo,
e que agora posso andar com as próprias pernas
ao longo e ao redor da vida e do mundo,
sem tropeçar nas aflições e nos barrancos,
sabendo
que Deus não dá asas à cobra,
e que a mim Ele dá asas, mas cobra.
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