quarta-feira, novembro 04, 2009

A LÁGRIMA (*)

Mais triste (do que uma granja de aves biônicas) Mais feia (do que um embrulho de mandiocas) Mais amarga (do que jiló no almoço ou no jantar) Mais dolorosa (do que uma paulada na moleira) Mais trágica (do que a morte do pudor nacional) Mais profética (do que as cintilações bíblicas) Mais pusilânime (do que o aleijado dos membros): é a inócua, ubíqua, ociosa, onímoda, aziaga e torrencial lágrima do ser humano brasileiro. É uma lágrima turva? Sanguínea? Esquentada? É salgada como o suspiro de um desvalido ou é doce como o suspiro da moça apaixonada? É álacre, cabisbaixa, é alada? Vem do cérebro ou do coração? Das ínvias cavilações da mente? É incolor, deprimente? Paira na pupila ou escorre e lambuza os pobres olhos do sofredor? Vem dos escaninhos da burocracia ou dos cofres do sistema econômico? Mais sanguinolenta do que o poente marítimo Mais zumbidora do que os mosquitos na lata de lixo Mais carregada de petrificações, a lágrima nacional inunda todos os quadrantes do país. 

(*) Escrito em 1998 e revisto em 28/10/09.