sexta-feira, novembro 22, 2013

A POESIA FALA A VERDADE

Intróito:
O caderno ILUSTRÍSSIMA, suplemento domingueiro do jornal “Folha de São Paulo”, enriquece duas de suas belas páginas na típica homenagem póstuma à Poeta polonesa Wislava Szymborska, Prêmio Nobel de Literatura de 1996.

Leitura de tanto interesse geral que não me contenho em transcrever um dos poemas para repartir o prazer com os leitores.

O poema intitulado COAÇÃO é traduzido por Regina Przybycien. Bom proveito, leitores amigos.

COAÇÃO

“Comemos a vida de outros para viver.
A falecida costeleta com o finado repolho.
O cardápio é um necrológio.

Mesmo as melhores pessoas
Precisam morder, digerir algo morto,
Para que seus corações sensíveis
Não parem de bater.

Mesmo os poetas mais líricos.
Mesmo os ascetas mais severos
Mastigam e engolem algo
Que, afinal, ia crescendo.

Custa-me conciliar isso com os bons deuses.
Talvez crédulos,
Talvez ingênuos,
Deram à natureza todo o poder sobre o mundo.
E é ela, louca, que nos impõe a fome,
E ali onde há fome
Finda a inocência.

À fome se juntam logo os sentidos:
O paladar, o olfato, o tato e a visão,
Pois não é indiferente quais iguarias
E em quais pratos

Até a audição participa
No que sucede, pois à mesa
Não raro há conversas alegres.”

Justifico a transcrição considerando que, no meu entender, só ela poderia dizer palavras (em conceitos e imagens) tão abertamente inaceitáveis na prática e verdadeiras no fundo, no meio e na superfície de toda vivência animal, mormente a vivência racional, especificamente humana. E insoluvelmente humana?
 Afinal: não passamos de viventes errôneos?

Pausa para meditação.
Penso que deveríamos ser menos carniceiros e carnívoros, menos pescadores e matadores, mais plantadores e cultivadores e humanos. E menos destruidores...