quarta-feira, agosto 23, 2006

LINGUAGEM

A oralidade continua às turras com a gramática Uma avança, a outra espera, sabendo como lá diz o sambista, que a deslealdade neste mundo é muito grande – e por isso Deus na terra não volta mais Nos percalços das folganças intrometem-se os revezes O brasileiro é o narcisista às avessas que cospe na própria imagem que bóia na flor da água? A oralidade está em toda parte falando pelos cotovelos Ao vulnerável a tentação logra seu intento sem forçar a barra? É bem sabido que a beleza imprime em quem a vê e sente as mescladas feições de angustiosa felicidade A gramática dorme o sono dos justos agüenta as pontas do fastio, do desconsolo para resguardar um mínimo de sensualidade na barra da saia, nos punhos da camisa agüentando aqui e ali os sinais de alerta não do incêndio mas do dilúvio. Os ares do outono respingam lágrimas? Dentro do corpo é a alma que purga em seus choros e coros os logrados amores Os indivíduos são diferentes, uns dos outros uns mais anormais, outros menos e nisso a psicanálise tem que se virar para ser exercida A cura pela palavra rendeu a Freud o rosário de conflitos e excomunhões A esposa Martha lia Dickens e Cervantes sem interromper nele o fluxo estudioso das deformações criadas e jogadas no cadinho dos incertos e miméticos destinos eivados de clarões sob tanta fumaceira O ser normal não passa de um pornógrafo platônico que abre a barguilha sem se aproximar? Uma certa imunidade mental aos males físicos encobre sem apagar a emoção exacerbada que fere mais que uma martelada no mindinho? As frases e não as palavras eram a paixão de Gertrude Stein Ela que amava os olhos amendoados de uma das mulheres de Picasso ela que ouviu de Picasso que um grupo de pessoas na Rue de Fleures em Paris não eram de homens nem de mulheres, mas sim de americanos É assim que se procura uma alegria na vertigem aveludada de um ventre dedilhando clitóris no erotismo inteligente do cineasta Claude Antant Lara? Por falar em cinema Lawrence Olivier nasceu para ser Hamlet na lindeza da chama angustiante na propriedade comportamental (a voz das mãos os gestos do olhar) na certeza das dúvidas existenciais? ele todo e sempre rijo na corda bamba como quem sabe e não sabe o que quer corrigir um erro em terra firme num mar de provações? Brigitte Bardot, ela sim, magra e sólida além das partes neutras desnudas e das partes pudendas também desnudas Ela sim tem os olhos escandalosos ora se tem! tem sim! cavadores de atalhos piscadores de lúbricos convites Olhos que sabem que o resto do corpo reluz neles nas multidireções dos pés à cabeça Eles sabem que o resto do corpo prescindem dos atributos simétricos e compassados no equilíbrio das distâncias na bela junção das partes e das anexações Eles sabem que em caso de necessidade são o próprio desejo do espírito no corpo na forma que agora reluz sobre as águas mansas e profundas no mar de uma piscina. Assim a linguagem inconsciente das aspirações está a um passo do alcance mas arredando o agrado que jamais logramos Sim é assim mesmo: a ventura adiante da poesia da poesia que vem na inócua perseguição nos traçamentos transversais É assim que algumas palavras versos poemas espirram ao léu de um céu repentinamente nas mãos e olhos dos leitores de sobreaviso E é aí que se lê em voz alta que a sensualidade é a raiz e a flor da sexualidade.