AMOR EM PEDAÇOS
1 – Súmula filosófica de André Comte-Sponville: “Aceitar e amar a vida como ela é mais do que esperar uma outra: seja uma outra vida depois da morte, seja uma outra vida aqui embaixo”. (Contra-capa do livrinho(livrão) “Nomes de Deuses – o Alegre Desespero” – tradução de Maria Leonor F.R. Loureiro, Editora UNESP, São Paulo, SP, 1999. 2 – Comentário do Leitor LB: mesmo sabendo que Deus não está olhando especialmente a minha pessoa, lá do céu (mesmo porque Ele assim não existe – nem o céu), não consigo libertar-me do hábito piedoso de, na solidão do sofrimento cotidiano que às vezes desaba sobre a minha fragilidade humana, das exclamações e lamúrias contraidas empiricamente ao longo do tempo (“Ah meu Deus do céu!” e “Acode-me, Deus, Pai Nosso!”). O hábito faz o monge, diz o provérbio erudito – e o uso do cachimbo faz a boca torta – diz o ditado popular. É certo que fomos educados, desde à infância, para sermos frágeis e dependentes – e, depois, por mais que desejamos reciclar nosso comportamento, nosso lado vulnerável nos trai, e os suspiros e as imprecações assaltam-nos naturalmente, como se a parte mórbida de nossa pessoa infiltrasse na nossa parte lúcida. O que mais precisamos saber e disso conscientizar é que, sem o Deus tradicionalmente inserido no nosso subconsciente , mesmo sem Ele, não estaremos desprotegidos em nós mesmos, não estaremos desolados e, por que não dizer, desesperados na solidão. Se um valor religioso esfumaça, um valor metafísico ilumina: se não podemos contar com a ajuda da transcendência, temos, à nossa disposição, o auxílio da imanência: a confiança nos valores da sã consciência, da fraternidade social, do amor das criaturas, da fidelidade nos valores morais e poéticos. É uma conversão que às vezes pode trazer lágrimas do coração aos olhos. É assim mesmo, a verdade triste e verdadeira. Mesmo assim ela é, essencialmente, necessária à saúde, sendo como é, fonte de movimentos direcionados a uma possível alegria feliz. 3 – Em Nome de Deus. Aprendi, desde a mais tenra idade, a dizer: - “Deus me livre! – Diante de uma adversidade. - “Graças a Deus!” – Diante de um benefício. - “Deus queira!” – Diante de uma boa perspectiva. - “Meu Deus do Céu!” – Diante de uma incógnita ou dentro de um suspiro de apreensão ou de alívio. - “Se Deus quiser!” – Diante de uma esperançosa oportunidade. - “Assim Deus quis!” – Diante de uma perda irreparável. - “Deus seja louvado! – Diante de uma graça alcançada. E por mais que na maturidade intelectual da idade adulta você passa a descrer num Deus assim tão pessoal e onipotente, você continua a repetir tais exclamações, acintosa ou instintivamente. Se não é uma crendice, não chega a ser uma blasfêmia, uma vez que procedendo assim o incrédulo retardatário não está fazendo nenhum mal a ninguém. 4 – O Verso Descolado. Ganhei o dia salvando um verso do marasmo prosaico. 5 – O Amor em Pedaços. - “Quem começa a entender o amor, a explicá-lo, a qualificá-lo e quantificá-lo, já não está amando” – Gilberto Freyre. - “Nunca devemos julgar as pessoas que amamos. O amor que não é cego, não é amor” – Honoré de Balzac. - “O que se faz por amor está sempre além do Bem e do Mal”. – Nietzsche. 6 – Atenciosamente. As pessoas sérias e atentas, coniventes e interessadas no desenrolar da vida no mundo são (e estão) aptas a prestar depoimentos nos anais da pesquisa sociológica. Suas antenas (precárias? Habilitadas?) captam e conservam os traços e rastros das pessoas e dos acontecimentos de, no mínimo, três gerações contemporâneas: a dela mesma, a imediatamente anterior e a posterior. Sabem de cor e salteado sobre uma porção de gente, de lugares, de acontecimentos. Vivem numa espécie de cenário tridimensional. Folgadamente. A Graça de Cantar. 7 – A graça de cantar é uma fluência instintiva que pode dispensar o recurso da lucidez. Reparem nos termos da trovinha popular: “Chuva choveu/ Goteira pingou./ Pergunta ao papudo/ se o papo molhou.” O Poeta russo, “ Maiakóvski, introduziu (por volta de 1912 e depois dele o francês Jacques Prévert) no poema a linguagem da rua, as palavras do povo e as construções gramaticais familiares, sem que o poema se perca por esse motivo na insipidez banal das conversas de mesa” (Francis Combes, em “MAIAKÓVSKI – Vida e Poesia” – editora Martin Claret, São Paulo, SP, 2008).
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