quinta-feira, junho 09, 2011

ÊXITO FUGAZ (*)

Uma vítima da opressão escrevendo a respeito dela, queixoso e magoado? Sim, assim é que é digno e justo. Só assim os gritos de horror do passado podem silenciar ao menos um pouco as gritantes ressonâncias de um futuro que está sempre a começar, sempre espinhoso. É doloroso reconhecer a permanência no cotidiano dos resmungos da mafiosa convivência social excludente. É assim que uma sujeira contraída involuntariamente vira nódoa na boca mesquinha de elementos de vidinhas insossas e ineficazes. Assim as nódoas doem como feridas, mesmo depois de anos e anos de nefasta purgação. Uma cruz perpetua. As nuvens de todo o sempre em toda parte (são cabelos aéreos de areia fofa). os dias, uns atrás dos outros, como gafanhotos, passam e repassam em exíguos espaços: a televisão e o bando de maitacas a falar da vida alheia, com as palavras do mau gosto. A corrupção dos costumes a ferir nossos tímpanos. Os dias encarreirados na mesma ocupação apocalíptica. O amargo silêncio dos desatendidos do sistema excludente. A preocupação genética de separar o joio do trigo na mesma nesga da lavoura, agora não mais arcaica, mas sim clonada. Tudo isso e o ressaibo do inferno reprisam o ditado de que quando os deuses querem destruir uma pessoa, primeiro eles a enlouquecem. Mas, passada a intempérie, o eterno aprendiz de poesia julga-se apto a citar o poema de Lawrence Ferlinghetti (“Encontro de Olhares no México”, tradução de Paulo Henriques Britto): “De repente você está falando comigo no meio da platéia enquanto recito meu poema. Meus olhos encontram os teus no meio da multidão Só um par de olhos num mar imenso de rostos: lanternas longínquas numa paisagem noturna, tremeluzindo. E os olhos falam - numa língua qualquer -. Termina o poema, os olhos continuam a queimar. E vem o aplauso como num mar escuro eu ouço o ruído distante, como quem ouve um búzio - farrapos de sol ao vento -. Depois vem tua voz numa língua qualquer - questionamento exaltado do meu poema. Eu respondo, falando para a platéia. Eu te respondo olhos negros falam a você no meio da platéia: ó morena “Não há outra como tu entre as dançarinas: Te amo”. ( Título de um belo filme estrelado por Doris Day e Kirk Douglas).