LONGE E PERTO
A Vovó Barreta. A noite é o dia invertido dos mortos, é o apropriado espaço das ações posteriores.... Meus débitos pesam mais na capanga: será que tenho algum crédito na contabilidade cármica? Em toda caverna, em todo capão de mato, há um sinal de alerta, uma nota de repúdio? É válido o arrependimento depois de muito tempo? O escritor Marcel Proust sempre se queixava do mal que fizera à avó materna. Eu também digo que nunca me saiu da cabeça o mal que cometia contra minha avó paterna, surrupiando dela algumas moedinhas que ela deixava transparecer em seus caseiros guardados. Eu embolsava simplesmente para comprar balas de hortelã na Venda do Zé Lucas. O que infantilmente cometia não seria um roubo com todas as letras da palavra, um ato feio e reprovável que até poderia virar mania e viciar-me pela vida afora, fazendo de mim um gatuno? Os níqueis furtados eram insignificantes na ordem das coisas, que apenas supriam uma boba carência que eu inadvertidamente contraira: comprar balas de hortelã. Hoje fico a pensar se minha avó não percebia a leviandade e, se percebia, por que não me repreendia? Ela estava nos seus noventa e tantos anos e era uma pessoa linda assim na velhice apaziguada. Parecia uma menina apesar dos cabelos brancos e das rugas e de algumas desarticulações. Linda como a criança que começa a entender as coisas, a falar e gesticular e andar, tudo ainda no estágio da primeira aprendizagem. Mas toda a boa lembrança dela não me redime do sentimento de culpa, essa nódoa indelével de nossa pele, de nossa medula, de nossa consciência. O sofrimento é muito mais inesquecível do que a ventura, assim escrevia Proust – e eu estou aqui a concordar e copiar.
A Vitória dos Homossexuais.
Merece aplausos e bons votos. “Se a homossexualidade fosse uma perversão apenas humana, não seria encontrada em outros animais”, afirma o escritor Drauzio Varella, com toda a razão. “É uma tendência descrita em grande variedade de invertebrados e de vertebrados, como répteis, pássaros e mamíferos. Negar direitos a casais do mesmo sexo é imposição que vai contra os princípios elementares de justiça”. Só pode ser a ausência de auto-crítica o fato do clero católico ignorar o estado laico de um governo democrático de aprovar e legalizar o matrimônio entre os homossexuais, quando uma providencia racional de sua parte seria aliviar o peso sexual que os clérigos e as irmãs de caridade carregam na obrigatória manutenção de uma irracional castidade. Se se liberar o estado civil nupcial para todos os chamados “seus fiéis”, um sol brilhante iluminará a face da terra. E viveremos em maior e melhor harmonia.
Pois É,
Pois é.
Assim é, se lhe parece, como diria Pirandelo.
A vida a jogar-se de um lado para outro,
a chocalhar-me sem complascência,
como se fosse um veículo doido e estragado, num reles mundo acidentado, sem a mínima trajetória de não-ir e de não-voltar. Creio que o trunfo que ainda me resta é a certa facilidade de às vezes entender-me com o silêncio das coisas se dos seres nos lugares deste mundo e desta vida.
O Humorismo Inglês.
- Numa recepção social o senhor de certa idade esbarrou-se na mesa de uma senhora idosa e, meneando a cabeça, disse: “perdão, senhora!”. E ela (um tanto surda ou cega?), com a mesma reverência, respondeu: “Está perdoado. Eu também sofro de flatulência”.
- Noutra recepção, um senhor, portando o inefável copo de uísque, procurava uma companhia para trocar idéias. Viu a senhora sozinha numa mesa, tomando guaraná. Aproximou-se e reverentemente perguntou: “a senhora é da Associação dos Anti-Anti-Alcóolicos? Ela prontamente respondeu: “Não! Sou da Liga de Proteção da Castidade Feminina”. Aí o senhor, constrangido, disse, ao afastar-se: “ah, eu bem desconfiava que alguma coisa não podia oferecer a senhora”.
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