sexta-feira, maio 12, 2006

OS CANTARES DE OUTUBRO I

I
Muitas crianças morrem de fome enquanto seguimos nas ruas do Centro onde o desgosto das casas é menos agressivo as rugas atacam a pele dos olhos. O samburá na estaca de arame o pobre roceiro pregado na cruz não havia um caminho começando ali? o cruzeiro da laje abre os braços o lavrador cai pela terceira vez. A caneta do chefe dava tiros fatais morrer aos poucos é a nossa vida o pau de espinho é a nossa bandeira a meningite esguelha outra criança. 

II Toda família tem a sua tristeza. O pai chega em casa bêbado a mãe bate no filho, em si mesma. Toda mulher feia é infeliz todo homem pobre é feio toda criança é abandonada. dorme que o lobo fareja o barraco dorme enquanto o lobo de pasta e gravata (chula e lula é a mesma burla, a mesma merda?) não vem te pegar. 

III Quem se levanta do nosso lado? o cão late dentro da noite um rio também, mas ninguém ouve da insônia da criança, apenas a fome. A morte lambe as rugas do velho. Somos milhões de cristos na noite da sexta-feira das paixões. Vermes da terra sáfara, flores deserdadas da concebível primavera. O latido vibra no ar, atravessa o rio das imundas fezes, grampeia três folhas de papel almaço. A criança contesta Deus, leva outra surra do pai. Quem vai recuperar a vergonha na cara de agora em diante? O que esses sacanas mais precisam? de fidelíssimos espelhos acusadores? Brasília corrompeu todo o país?