segunda-feira, maio 08, 2006

O APRENDIZ DE POESIA E OS MESTRES DE POLÍTICA

Ao longo de minha vida exaustivamente desenrolada, aproximei-me muitas vezes de homens públicos de renome, não para pedir e sim, modestamente, para oferecer os préstimos, sabendo que na oferenda estava era tentando defender um meio social que dependia das ações daqueles homens públicos. Acacianamente falando: se a sociedade ganha, é o indivíduo que ganha – assim eu pensava e ainda penso. Foi assim que montei guarda na entrada de uma luxuosa mansão em Uberaba, onde o então Presidente Getúlio Vargas, em 1952, descansava da fustigação de seus adversários, que depois o destruíram. Na época eu fazia o serviço militar e merecia a confiança dos superiores do batalhão para colaborar no trabalho de proteger o ex-ditador de um possível atentado. Anos depois, trabalhando na construção da Usina Hidrelétrica de Salto Grande (a maior da CEMIG na época), eu era sempre requisitado pela Gerência das Obras para integrar uma equipe que ficava à disposição do Governador Juscelino Kubitschek, na Casa de Visitas, onde ele se hospedava com a esposa, Dona Sara e as filhas Márcia e Maristela, os assessores palacianos e ilustres convidados (jornalistas, políticos, empresários). Com seu peculiar dinamismo, ele executava o projeto do binômio Energia e Transporte, com o qual abriu o caminho para chegar à Presidência da República. Ele ia quase todo mês vistoriar o andamento das obras, sempre afável, brincalhão, e todos sentiam prazer em servi-lo. Lembro-me de uma vez que saí à procura de jabuticabas, a pedido dele, e fui encontrá-las nas imediações de Braúnas – e isso foi recebido como uma proeza, pois não era tempo de jabuticabas. De Tancredo Neves aproximei-me duas vezes, uma em visita cultural na sua Fazenda da Mata, em Cláudio, sem incomodá-lo em seu merecido descanso rural. Mas aproveitei a viagem para colher as imagens, as idéias e as palavras de um poema em homenagem ao que ele tão bem representava como estadista da República. A outra vez, infelizmente foi no Hospital em São Paulo, quando ele estava entre a vida e a morte – e eu modestamente participava da equipe mineira no Congresso de Escritores Brasileiros. Convivi também, prazeirosamente, com o Deputado, Ministro, e governador de Brasília José Aparecido de Oliveira, quando coordenei a execução de um projeto de pesquisa da cultura popular de Minas Gerais, sendo ele na época Secretário de Estado da Cultura de Minas. Estive com ele em Brasília, participando de um Seminário que reuniu intelectuais de todos os Estados para que se estabelecessem os princípios teóricos de uma política cultural que iria nortear a funcionalidade do então recém-criado Ministério da Cultura. Tive ainda o prazer de conhecer outras ilustres figuras da vida pública nacional, que tanto admirava na época e hoje nem tanto (exemplo: Fernando Henrique Cardoso e Luis Inácio Lula da Silva, que tanto decepcionaram seus eleitores). Mas de Itamar Franco guardo uma lembrança toda especial. Aconteceu na década de 70, quando ele rompia os horizontes de sua Juiz de Fora para brilhar no cenário nacional, com seus inequívocos traços de mineiridade, seus prementes atos de idoneidade. Aconteceu que um jornal da cidade (do qual na época eu era colaborador) pediu-me para entrevistá-lo, quando aqui esteve em acalorada discussão com as lideranças políticas e empresariais da região. Lembro-me que havia um jantar num salão enorme de um clube social, repleto de gente interessada nos debates – e num dos intervalos, ele deixou seus pares e amigos para atender-me, com a maior das boas vontades, sentando-se numa mesa isolada, com as respostas às minhas perguntas, que eu ia anotando num maço de papéis. A entrevista ficou bem legível depois de publicada, com honestos dizeres em caixa-alta e toda a gama de idéias e intenções dele a favor da luta das pessoas de bem contra os desmandos da ditadura militar daqueles sombrios tempos. Quando o trabalho foi publicado, mandei um exemplar do jornal pra ele, então Governador do Estado, e logo recebi seu telegrama, elogiando o texto, agradecendo a fidelidade ao que realmente dissera na entrevista. Fiquei gratificado porque na verdade era a primeira (e talvez a única?) vez que um político me agradecia por um trabalho cultural sobre o exercício do poder público. E não ficou só nisso. Dias depois recebi outro telegrama dele, renovando os elogios e os agradecimentos, belo gesto, típico de um político lúcido e sensível em suas ações salvacionistas de um situacionismo brasileiro pós-collor e depois mineiro pós-azeredo. Experimentei também alguns desprazeres em contatos com outros políticos, mas isso não vem ao caso agora. Sei que toda aprendizagem poética passa pela política, da qual sai arranhada de um lado e enriquecida de outro. E creio que toda aprendizagem política devia passar pela poesia da verdade e da beleza, o que por mal dos pecados raramente acontece.