quinta-feira, março 08, 2007

MULHER

MULHER, PAÍS ESTRANHO? - Lázaro Barreto.


Uns chamam de facécia, outros de metáfora, o fato é que as figurações tropológicas do Velho Testamento a respeito das histórias da criação do ser humano (a mulher saindo da costela do homem) e da maçã de nossa eterna condenação, são muito propagadas e debatidas. A contrapartida tropológica está sempre a se manifestar, alegando principalmente que quem nasceu primeiro foi a mulher, da qual todo homem nasce, desde sempre. A revista VEJA desta semana estampa a bela e concisa reportagem de capa sobre a questão, sob o título “Enfim a Ciência Entendeu a MULHER”, na qual, além de citar o livro da cardiologista americana Marianne Legato, “A Costela de Eva”, revela inúmeras constatações científicas. Entre as quais pinço as seguintes:
- Na mulher as conexões entre os neurônios são mais numerosas;
- a visão periférica da mulher é melhor do que a do homem;
- o olfato é mais aguçado;
- a capacidade respiratória é maior;
- o coração do homem é maior, mas o batimento cardíaco na mulher é mais rápido;
- a adiposidade na mulher se concentra mais nos quadris, glúteos, coxas e braços – e no homem no abdomen e nas costas;
- na mulher o vício do tabagismo é mais psicológico do que químico;
- a maior incidência de depressão na mulher é uma questão meramente cultural;
- as mulheres são mais falantes porque possuem mais regiões cerebrais relacionadas à linguagem verbal;
- as mulheres captam mais detalhes porque mesmo em repouso 90% de seu cérebro permanece em atividade – e no masculino apenas 70%.
A reportagem, fartamente ilustrada, e assim melhormente legível, é de Karina Pastore e Paula Neiva.

Do livro “QUE É A MULHER”, de Seymour M. Farber e Roger H.L. Wilson, tradução de Sylvia Salles Oliveira Jatobá (Fundo de Cultura, RJ, 1963), que li em 1970, transcrevo outras constatações da época, a seguir:

“Existe uma diferença endócrina e metabólica sutil entre os meninos e as meninas, desde antes do nascimento até a vida adulta. A menina desenvolve-se mais rapidamente do que o menino, tanto física como mentalmente. Na idade da puberdade a menina está aproximadamente um ano à frente do menino da mesma idade”. A partir daí é que a influência cultural da sociedade inverte os papéis, priorizando a ascendência física e mental do homem, tudo a favor da hegemonia machista que tanto acirra a repulsa das feministas, com toda razão, até os dias de hoje.

- Em 1958, num simpósio do Instituto de Pesquisas Fels, lançou-se a indagação: “que espécie de histórico de desenvolvimento é necessário para fazer de uma menina uma pessoa intelectual?” A resposta foi: “O modo mais simples de colocar a questão é que ela precisa ser uma traquinas em certa época de sua infância”.

Em 1781, Emanuel Kant, “em uma das maiores conquistas intelectuais da História (...),
demonstra o assombroso papel da subjetividade na nossa concepção do cosmo externo”, valorizando uma virtude feminina intrínseca, até então aleatoriamente subalterna à objetividade, um traço de caráter imposto mais ao homem do que à mulher. Assim, na poesia, ela dizia na voz de Edna St. Vincent Millay:
“Sei muito bem que sou, para o teu coração,
não as quatro estações, mas apenas o verão”.
E na voz masculina de E.E. Cummings:
“Ela, a de lábios frágeis e profundos
que pisaram com suaves pés de abril
nos ásperos desertos de minha alma”.

- Condenadas a uma longa abstenção da sexualidade, elas são forçadas ao apego da fantasia, e quando resolvem desfazer as conexões assim formadas na mente, tornam-se psiquicamente impotentes, ou seja, frias, quando as atividades se tornam permitidas. É claro que essa situação já mudou nas áreas em que a emancipação feminina efetivou-se.

O livro é massudo (quase trezentas páginas), legível, explicativo, contendo o que de melhor se podia levantar, na data da publicação, sobre o tema, eterna e universalmente propalado do eterno feminino, tão bem expresso pelo poeta Coventry Patmore:
“A mulher – país estranho
Onde , embora chegue jovem,
O homem jamais compreende
Costumes, língua e política.”