ASAS DO DESEJO (*)
A guerra – uma contrafação sanguinária – camufla o que há de podre e cruel no ser humano. No filme o cineasta Wim Wenders desguarnece os efeitos do holocausto e da divisão da cidade arruinada, através de um cenário fantasmagórico (real e onírico de vez em quando?, no qual só mesmo a (im)possível presença dos Anjos da Guarda (invisíveis e no entanto bem palpáveis) acendem alguns lampejos na escuridão, respondem algumas perguntas irrespondíveis das crianças. A Equilibrista faz do corpo esbelto uma espécie de alma materializada, envolta em nuvens e aplausos. Sentiria falta de vida, se não a exibisse aereamente como se fosse o belo efeito de uma taça do mais puro licor da alma. Sentimo-nos, vendo-a movendo-se no ar, que o corpo é muito mais do que aparenta ser. Os dentes dela brilham no escuro como se fossem flores entre folhas. Assim tão cheia de graça cativa o Anjo egresso das altitudes – e quando chega perto dele, não deixa nada a desejar. Ela é um anjo também? Roubaria a cena até de uma certa eternidade, não? A flutuar no espaço azulado da perenidade pacífica, transcendendo a circunstância aguerrida.... Assim o tempo e o espaço casam-se no amor de cada um. O instinto nos leva para onde? Não sabemos. Ele, o instinto, saberá? A Solidão é a integridade? O Amor é apenas a metade? O Homem e a Mulher: uma dualidade indivisível? As partes de ambos ajustam-se na unidade multiplicável? O que há com a Paz, que nunca mereceu, na literatura universal, uma epopéia (tão encontrável nas descrições e narrações de tantos rapsodos)? Só palavras passageiras, lembradas na brevidade da desimportância? Nas mãos dos bons autores (literários, cinematográficos, teatrais, plásticos) até as pedras ganham vida (diria até mesmo que até a morte ganha vida). Por que a Paz não alcança os paramos de um enredo à altura de sua importância, em trajes de poemas, romances, telas pictóricas, filmes de ação e de nostalgia? Seria desinteressante sob o ponto de vista comercial, ou seja: é desprovida do apelo emocional que clama aos céus por uma dor nela inexistente? A doçura não conta, neste caso? Todo leitor e/ou espectador, seriam então sado-masoquistas? A Paz, ora essa, a Paz é a PAZ! Não é como é o desejo de todas as pessoas do mundo de amar e de ser amado? A Paz...: Sua inspiração é pouco durável? Ela não deixa nascer ou florescer os seres humanos heróicos, transcendentais? É mesmo assim modesta, humilde, cheia de si na tranqüilidade? Só bafeja, doura e encanta, os pobres seres humanos que, nas cenas empolgantes da vida, não passam de meros figurantes? A PAZ, uma Beleza (que pena!).
(*) – Escrito sob a inspiração despertada pelo filme ASAS DO DESEJO, de Wim Wenders.
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