quinta-feira, abril 20, 2006

CHARLES DARWIN (1809-1882) E A EVOLUÇÃO DAS ESPÉCIES

O nome, de longe, chega perto da pessoa, que nos leva ao seio da floresta a caminho da montanha, até chegar à paragem dos nômades aos quintilhões de seres vivos trabalhando, alimentando de amor e de canções e algumas ferroadas as noites e os dias dos séculos a fio. Afoito e ressabiado, temente na audácia, enfia a cara no mato e na água entra na loca da pedreira, escava o chão, sobe na árvore agarra o bicho pela sombra anota no caderno a tiracolo as hipóteses e deduções e lembretes :apalpava a galinha como nossa vovó caipira? Queria porque queria saber das coisas: pergunta a Deus...: fazia silêncio para ouvir a resposta. Era muito sabido – mas seria o suficiente para entender o que Deus dizia?, para traduzir o que Deus dizia? Talhado para ser um pároco anglicano, quando via estava à deriva do corolário sem conseguir recompor-se na aceitação do ideário preconcebido do tacão vitoriano... ...anos a fio assim matutando, sem poder assumir o avançamento, sem conseguir recuar ou esfriar a febre dos renovados impulsos possessivos. Ah! o animal que há em nós absorve o sopro de vida, transcende o que nos flagra de vez em quando, expande em nós o sopro feliz de vida. Mutantes nas quinze bandas descortinadas: o humano o pássaro a formiga o gado a tropa, todos juntos em milênios e milênios, cada um em suas bitolas e diapasões, em suas escritas e feitios, em seus ecos e silêncios.... Alguns fundadores da citologia diziam em 1830: “os animais e as plantas são compostos dos mesmos elementos, as células”: se há apenas um código genético é porque a vida se originou de uma só vez : a síntese darwinista segundo Theodosius Dobzauski: nada no mundo vivo faz sentido fora da luz da evolução... : o lógico e o psicológico: a biologia entra fundo no primeiro e perpassa a superfície do segundo... mesmo assim concorre para a boa determinação das causas e feitos da angústia animal: a retrospectiva do nascimento a perspectiva do amortecimento. Estou ficando careca de tanta preocupação, ele devia dizer a si mesmo, quando rodeava o dogma da criação e da procriação e machucava o coração de Deus, discordando de alguns mandamentos. Não podia publicar as idéias, não conseguia sufocá-las. Durante vinte anos viveu o drama dos empaturramentos, das azias e dos enjôos, a pisar nos dormentes em brasa da ponte pênsil sobre os abismos..., só depois, longe do anglicanismo, é que desfrutou do “caos de delícias” da floresta tropical da Bahia. Aos trancos e barrancos, escondendo-se de Deus e de si mesmo, foi dando um jeito de enganar a ambos e contestar (de leve, aos poucos) o consagrado: não era isso o que fazia, meio lúcido, meio tímido?, não estava aos poucos e de leve avançando o sinal verde do livre arbítrio?, podia discordar sem ofender? Se esfriasse a cabeça e espatifasse o lápis teria sossego nos dias quentes e nas noites frias? Meu Deus, ele pensava. Estou tratando-O como um simples demiurgo?, esquecendo de Suas radiações, transcendências, sublimações? Fazia alguns dias de pausa, depois reatava os liames, arrojava o ânimo, reconsiderava as proposições. Voltava sempre à tecla inicial; o homem pode ser filho de Deus, mas é um animal; o animal pode ser filho de Deus, mas é um animal. Ambos são, pois, iguais na irmandade, não? E é assim temeroso e reverente que chegou a ser (quem sabe?) quem mais perto chegou de Deus até hoje. A careca límpida e sapiente da meia-idade, pontuda na velhice, acima da barba em neve e do olhar atento e da boca fechada a dizer e repetir: não castigue o bezerro, não monte no cavalo não mate nem coma o porco e o peixe: a dor de cada um deles é a mesma de cada um de nós.... A unidade psicossomática era então uma convicção que preludiava outras convicções... Mesmo tímido e adoentado ia sempre ia sempre às fontes da história natural por amor e não por ideologia: o que trazia de lá eram águas e alimentos não perecíveis, inteiramente palatáveis. Diante do Terremoto do Chile em 1835 ele viu a vó por uma greta: as montanhas soerguiam do solo! Em dois minutos a terra firme estremeceu debaixo de seus pés “como uma crosta sobre um fluido”... De repente o homem é muito pequeno dentro da natureza infinita....Assim passava o ano de 1832, lendo “Paraíso Perdido”, de Milton, na floresta tropical da Bahia (*), sob arroubos de prazeres simultâneos..., logo depois estuda os pólipos e algas e outros invertebrados marinhos, os besouros da entomologia, o comportamento das aves, das iguanas e tartarugas, as idéias de Malthus e de Comte, sentindo, outrossim, o remoto parentesco das espécies vivas. estuda as cracas e os macacos, fica sabendo através de Spencer da sobrevivência dos mais aptos e compartilha da teoria de Huxley, que recomendava uma boa distância que a ciência devia manter do governo e da religião. Muito depois, em 1873, estava no quintal a estudar as minhocas e as orquídeas, antes do passamento definitivo e depois de cumprir um belo destino. foi sepultado ao lado do túmulo de Isaac Newton na Abadia de Westminster, Londres. 

(*) Foi nesta oportunidade que pôde certificar-se da veracidade da seleção natural, observando os insetos no auxílio da preservação de certas árvores no momento mesmo em que rejeitavam outras, mais avassaladoras. Pois que interrompendo a proliferação de uma espécie, possibilitavam o vicejar de outra vegetação ameaçada de extinção pela prevalência da mais avantajada. Depois da Bahia, ele esteve no Rio de Janeiro, onde constatou certa leviandade no caráter do brasileiro que, tendo dinheiro, compra tudo e, não tendo, vende tudo. Acrescentou a picante observação de que lhe foi difícil manter a dignidade pessoal numa cidade carnavalesca que brindava os passantes nas ruas com baciadas de água caseira.