quarta-feira, dezembro 06, 2006

A ARTE DE OLBINSKI (*)

Ele e Ela cavalgam na mesma direção em linhas curvas. Encontrar-se-ão um dia nas águas aéreas e terrenas dos horizontes? O criador e a criatura: uma contradição em termos (as árvores verdes no ar e as secas no chão)? Depois a mulher avulta e o homem míngua aos olhos míopes do neutro observador. O encontro de ambos está marcado nas intercessões, nos gradis e nas costas da viva roupagem da mulher que se afasta, temerosa de novos arranhões. A mão que tampa o olhar é outro olhar, voltado para dentro de si mesmo. A vulva que tampa o olhar é outro olhar, onipresente, através do qual o mundo é a feliz fugacidade, invisível na estupefação. E aí surgem Salomé, Manon Lescaut: é assim que lentamente elas salpicam e dulcificam as curvas de nossa escada de Jacó, rumo à incerta, imprecisa eternidade? O tesão conjugado ao baile das esferas rebenta as cordas da lira que adormecia o rosto feminino da paz mais íntima? As queridas pulsões de Puccini e de Nino Rota passam do bucolismo à sofreguidão do confinamento de uma amplidão minimalista, lá nos confins, onde nossa vista nem alcança. A pungente Aida embevecida de Verdi. As esfinges Electra e Cinderela, trepadas em carruagens e engrenagens, vão na corda bamba dos atraentes abismos das musas e sereias dos musos e ulisses vão sob o impulso da arriscada travessia, onde se dá muito bem, muito bem! a poeta Leila Miccolis, defenestrando a didática do excêntrico e do hermético, pondo em pratos limpos e diáfanos um cardápio mais palatável, dando a entender que a simplicidade não é tão simples que a dificuldade está ao alcance das mãos que a inteligência tem as costas largas que a sensualidade tem os peitos redondos, e afáveis. 

(*) Improviso diante da projeção de um e-mail gentilmente enviado pela poeta Leila Miccolis.