quarta-feira, julho 14, 2010

FELIZES, OS NORMAIS

(Paráfrase de um poema de Roberto Fernandez Retamar, traduzido do castelhano por Marco Antônio C. Guimarães e publicado no jornal literário AGORA, de Divinópolis, MG, na edição de março de 1969, e republicado por mim em forma de paráfrase no livro “Mel e Veneno” (Edições Expresso, Divinópolis, 1984). 

Só os normais, estranhos seres, são felizes.

Não sofreram mãe demente, pai alcóolatra, filho delinquente

Não amargaram a casa de parentes,

nem choraram uma doença incurável.

 

Esbanjando roupas e sapatos,

Eles vivem os inumeráveis rostos da alegria,

atravessam crises e epidemias incólumes,

eles que nasceram com a bunda para a lua.

 

Eles de carro esporte e elas de fio dental,

homens vestidos de trovão e mulheres de relâmpagos,

altos funcionários, se querem um emprego,

elegantes pleibóis, se não querem.

São felizes como as aves, o estrume, os chafarizes.

 

Mas que deem passagem aos que fazem os mundos,

que não estorvem os criadores de palavras sinfônicas

e outros sonhos.

Que não barrem a passagem dos que são

mais dementes que as mães, mais bêbados que os pais

mais delinquentes que os filhos

e muito mais devorados por amores calcinantes.

 

Que a esses réprobos devoradores de paixões,

deixem ao menos deixem um lugar no inferno.

É o quanto basta.