terça-feira, novembro 01, 2011

OS FELIZES OITENT’ANOS

Há quarenta mil anos que procurava, Que procurava um livro, uma sombra, Que procurava em toda parte a cósmica alegria E a eterna lágrima Da dor que eu sentia como filho de Deus E enteado do Demônio. E foi num dia de chuva, numa praça de pedra, Que encontrei Carlos Drummond de Andrade, No município de Guanhães, fração do universo Mineiro que ele canta. Encontrei O canto, o livro, a sombra. Há quarenta mil anos que sondava a gruta Do Levante Espanhol e da Lagoa Santa, Procurava o papiro, a tábua da lei, a canção Que encontrei nas portas abertas das montanhas De Minas e de Drummond. Li os poemas do homem falando com o homem, Senti o choque e o repouso, o fluxo Que me retém na faixa do silêncio revolucionário, Onde cada palavra é um corpo que povoa o novo mundo. Encontrei retraídas fichas de identificação, Delicados meios e nuances de me comunicar Através de muros e de mares: Essa boa, farta e mansa, chuva de versos Que semeia adeuses e caminhos. Há quarenta mil anos que procurava A sombra e o fogo dessa árvore Que agora me embala e me sacode. (Divinópolis, MG, 1973). 

Anexo: Cópia de carta manuscrita de Drummond, datada de “Rio de Janeiro, 14 de março de 1983: “Meu caro Lázaro Barreto: “Seu poema, que o SL do “Minas Gerais” publicou, penetrou fundo no coração deste octogenário. É das coisas mais belas e magnânimas que já recebi, sem tê-las merecido. A você, num abraço caloroso, o profundo agradecimento de Carlos Drummond de Andrade.