TEATROLOGO E POETA ANTÔNIO D. FRANCO
A mídia às vezes contempla com excessiva luminosidade os autores de época , badalados por tantos instrumentos de comunicação nos dias mais correntes e corriqueiros. E obscurece (esquece, por inoportunidade, de iluminar) os por assim dizer eternos contemporâneos. Revolve demais os vivos recentes sem atentar que os mais antigos, já cristalizados na história da civilização, são até mais importantes. Essa preferência midiática, incidindo na formação intelectual das novas gerações, instaura um contra-senso por causa da contaminação da apologia ou da angustia que cada época transmite, escancarando, assim, uma certa nocividade da influência. O culto da violência no cinema norte-americano, do nauseado existencialismo sartriano, do realismo fantástico latino-americano, da dialética do esquerdismo versus direitismo, cujos respaldos negligentes resultaram em tantas obstruções e retrocessos. Já a influência exercida por autores mais antigos, em sucessivas gerações não ocasiona os referidos malefícios, uma vez que toda a experiência já foi recalcada por muitas outras gerações ao longo do tempo e, agora, purificadas dos escolhos que enodoam as propalações culturais ainda imaturas. Sabemos que muitos autores famosos que bolinaram a angústia de sua contemporaneidade não conseguiram sobreviver na posteridade simplesmente porque suas obras continham abalos apenas contingentes, momentâneos, ao passo que as obras de autores consagrados pelo crivo dos anos permanecem na vivacidade (sempre moderna) porque seus legados vivenciais contem maior número de células de perenidade existencial. A ambientação das peças de Antônio Franco é fiel aos panos de boca e de fundo do palco instalado no planeta a partir dos anos 60 do século 20: o calor e o frio de uma espécie de rito de passagem propiciatório de novas feições comportamentais do ser humano mediante as novas inquisições, propostas e balbúrdias ideológicas. Na peça “Os Melhores Anos de Nossa Vida” o convívio é o das tertúlias metropolitanas de jovens apavorados com os novos e sucessivos estereótipos ideológicos da cultura multifacetada:o neo-realismo italiano, a nouvelle vague francesa, as contrafações pictóricas e musicais da arte pop e dos beatles, a contracultura dos hippies e andarilhos, um mundo em alternadas decomposição e recomposição, o diabo a quatro. Na outra peça do livro, “O Jardim das Margaridas”, sentimos o amadurecimento ou endurecimento de alguns dos personagens egressos da tertúlia anterior, agora vivendo no pequeno inferno do lar, remoendo os grãos da morbidez , acumulados no paiol das seguidas insatisfações existenciais. Tudo muito humano, sobremodo humano, como diria Nietzsche. Tudo escrito com a eximia acuidade que faz da ficção e da realidade o mesmo jogo do corpo e da mente. O filme “A Mão Esquerda de Deus” (um dos melhores que jamais vi) é mencionado, e também a técnica de suportar o insuportável, com a fala visceral de Verônica: “Eu não o abandonarei nunca, Morais! Você terá de me suportar, sabendo que apenas o suporto também. E a cada manhã, quando me olhar, saberá que tenho pensamento que nunca serão seus, nem para você. Sentindo que não suporto mais o toque de sua pele, seu jeito de andar, de falar, de respirar, o modo como penteia os cabelos. Serei o seu inferno e você, o meu inferno”. AMOR E PAIXÃO (*). o Poeta Antônio Domingos Franco irrompe do teatrólogo e do homem Antônio Domingos Franco assim de supetão, veemente e atencioso, descerrando a cortina, não do palco para o publico, mas do quarto mais íntimo para o mais confidente leitor. PÁSSARO NA JANELA é um canto difícil, uma confissão feita sob persuasiva pressão dos obsessores poéticos. Algo assim que se quer evitar, camuflar entre evasivas, mas que furtivamente escapole entre os dedos e da frestas e vai ganhando aceleração em queda livre até a decolagem do belo pássaro ao sol, libertário e cantante como a mais legítima voz da poesia. Parece uma história mal contada. Pois todo poeta percorre um longo e tortuoso caminho de provação e aprendizagem. E geralmente o que persevera é duro na queda, carne do pescoço, aprendeu tanto a sofrer que se tornou incólume ao sofrimento vulgar, está quase acima do bem e do mal.. Antônio D. Franco já nasceu sabendo,ou seja, quando quis escrever versos (sem as dores e as impertinências de quem não se sente seguro nem aprova os próprios escritos), escreveu sem titubear e sem desafinar. Parece uma história mal contada, a do teatrólogo que deu certo escrevendo versos. Seus versos estão aí no livro, fluíram direto do coração e do cérebro do poeta para as páginas em branco. Lendo-os de qualquer ponto de vista e de apoio, a gente não detecta neles nenhum esforço de parturiente, nenhuma elaboração formal, nenhuma martelação conceitual apriorística. Nasceram quase que espontaneamente do coração e do cérebro de um homem que, sem dúvida, tinha tudo em si mesmo (os prazeres do céu e as dores do inferno, conforme Blake,) para escrevê-los. PÁSSARO NA JANELA, uma apaixonante história de amor. Ou melhor: uma paixão convertida em poemas de amor, ainda intumescida das contundências e coágulos, ainda machucada, dolorida e inexcedível como toda paixão que sufoca e transcende o simples amor para tornar-se em dor quase trágica: toda canto poético. É isso mesmo. A beleza de uma paisagem natural às vezes é tão avassaladora que nos inebria o olhar, e nos fascina. Mas depois, onde pastavam meigos potros enluarados, vemos tigres ferozes e insondáveis. De repente o ar se crispa e não se sabe mais onde estamos, pois o amor revestiu-se de ódio e este galga os píncaros da paixão incandescente e explosiva. Então, só mesmo a poesia pode amansar de novo as feras loucas em litígio.O pássaro na janela canta tudo o que vê na casa ardente e no jardim romanesco.. (*) Texto que escrevi para uma espécie de prefácio do livro supracitado, em setembro de 1983, agora ligeiramente revisto.
1 Comments:
Olá Lázaro! Sou Paula Braga, sobrinha do prof. Welber da Silva Braga, falecido em 2006, residente aí pertinho, em Formiga, e muito amigo do Antônio Franco. Estou acalentando o projeto de publicar a obra literária de meu tio, maravilhosa e inédita, em sua maior parte, e preciso contatar o Franco. Não o encontrei através da internet...Você pode me ajudar? Muito obrigada! Adorei seu texto! Abraço, Paula. Contato:paulamurtabraga@gmail.com ou (48)99824707
Postar um comentário
<< Home