sábado, fevereiro 28, 2009

UM ESTADISTA BRASILEIRO

Às vezes a gente lamenta a deficiência de homens públicos que mereçam um pedestal na história de nosso país. De um modo geral, pensando bem, quem se levanta das sombras para o sol da glória patriótica? Vários nomes ocorrem, mas surgem ensombrados de dúvidas e de senões ao lado dos feitos positivos. De relance, instantaneamente e instintivamente, salta-me aos olhos da memória a figura aprumada, límpida e exemplar de Joaquim Nabuco, o verdadeiro (mas não o único, reconheço) estadista brasileiro. Relativamente ao estado de Minas Gerais temos o Teófilo Otoni, o Afonso Arinos, o Milton Campos, o Tancredo Neves, o Itamar Franco – e penso que todos os estados da federação devem ter lá os seus ícones excepcionais, mas a nível nacional o meu voto vai para Joaquim Nabuco, cidadão, intelectual, homem público por excelência, inspirado, lutador e produtivo. Quando li sua obra prima, “Minha Formação” (Editora EDELBRA – Erechim, RS.), cheguei a sentir a epifania patriótica renascer em meu conturbado coração de brasileiro, pisado e repisado de anos e decênios de desilusões e comiserações. No final da leitura, tinha preenchido o branco das últimas páginas com dezenas de incontidas anotações. Isso em fevereiro de 2004, sem nenhuma intenção de aproveitamento em resenha, na época ou depois. Mas lendo agora os originais de um livro de Ruy Barreto sobre as trapalhadas da política brasileira nas transposições da economia açucareira para a cafeeira, marcadas a ferro e fogo na efígie da brasilidade pelo estigma da escravatura que teve início, meio e fim abomináveis, ocorreu-me rever a figura de Joaquim Nabuco, no papel do abolicionista cristão, lúcido, justiceiro e coordenado, uma figura que se contrapõe ao do badalado Rui Barbosa, que na verdade foi um vilão no lamentável episódio. Joaquim Aurélio Barreto Nabuco de Araújo (1849-1910), filho de Ana Benigna de Sá Barreto e de José Tomas Nabuco de Araújo, possui em sua identidade histórica o renome dos primordiais desbravadores e civilizadores das regiões norte e nordeste, além de acumular em seu currículo de vida, títulos e honrarias (advogado, jornalista, escritor, diplomata, deputado, ministro, abolicionista) que obteve por mérito próprio e que exerceu com lealdade, discernimento e tenacidade.Uma diplomacia de amor, inteligência e honestidade. Revendo as anotações, copio as mais interessantes, livremente, sem aspas obrigatórias. O sábio é uma fonte de várias bicas. A raça negra estava órfã de Deus? O frêmito de alegria da natureza transparece nas borboletas vivas no raio interior que temos de fixar como nota íntima e não (nunca) desbaratar. Nenhuma classe dirigente tem o direito de escravizar a classe dirigida. O trabalho escravo é uma vilania. As paisagens cariocas da época eram trechos do planeta em que a humanidade ainda não tinha tomado posse: nesgas paradisíacas anteriores às primeiras lágrimas dos homens. Temos em comum com todas as civilizações da humanidade o mesmo “fundo comum de língua, religião, arte, direito e poesia, os mesmos séculos de civilização acumulada e, portanto, desde que haja um raio de cultura, a mesma imaginação estética e histórica”. Graças à influência que sofri na Europa (ele diz em outra página), voltei consideravelmente menos político do que quando partira. Na página 108 ele cita o Presidente Tilde (dos EUA): “uma grande e nobre nação não separa a sua vida política da sua vida moral”. A temática da Abolição prepondera, em linhas gerais, no livro. Na página 182 ele opina que “se a monarquia pudesse sobreviver à abolição, esta seria o seu apanágio; se sucumbisse, seria o seu testamento”. O que acabou acontecendo, apesar dos pesares. Retrocedendo à página 100, encontro o que ele afirma com todas as letras: “Se a abolição se fez entre nós sem indenização, a responsabilidade não cabe aos abolicionistas, mas ao partido da resistência. Meu projeto era abolição com indenização”. Sobre a corrupção política, ele parece estar falando nos nossos dias: “Desde que a corrupção reina nos dois partidos, que ambos têm as suas chagas conhecidas e as suas ligações comprometedoras, todas as campanhas a favor da pureza administrativa têm muito de insincero, de simulado, de convencional”. Referindo-se ao barão de Tautphceus, seu mestre e amigo, ele patenteia sua veia ecologística: se fosse “ele o descobridor e possuidor da América, o machado nunca teria entrado nela... E o tição? Uma queimada era para ele igual a um auto-de-fé. O incêndio a lamber essas resinas preciosas, essa seiva, esses sucos de vida, esse sem-número de desenhos caprichosos de artistas inexcedíveis cada um no seu gênero, modelos de cor e de sensibilidade, todos eles únicos, parecia consumir com uma dor cruel, vibrante, todas as suas ligações sensíveis com a natureza e a vida universal, os nervos todos de sua periferia intelectual”.

segunda-feira, fevereiro 23, 2009

OS RETALHOS DO TECIDO III

- As figuras bíblicas do fariseu e do publicano representadas nos dias atuais? O primeiro orgulha-se de pertencer à classe dirigente – e sem mover uma palha é a favor da Justiça e da Virtude, julgando-se superficial e sorrateiramente um justo e um virtuoso. O publicano, coitado, drasticamente rebaixado na escala hierárquica social, alimenta-se de cabeça baixa de retalhadas sobras, consumindo-se aos poucos entre a inveja e a rebeldia arraigadas no subconsciente. O cristão verdadeiro não é o primeiro nem o segundo. Quem será? Alguém aí conhece ao menos um deles? - A presença online da literatura vem suprir, com muita limitação e até certo ponto, a ausência de novos autores publicados nas editoras comerciais, que preferem publicar os autores bafejados pela mídia, entre os quais figuram uma porção de verdadeiros não-escritores (políticos, artistas de cinema e de TV, jogadores de futebol, criminosos famosos). Ao autor sério o que interessa e encanta é o leitor com o livro nas mãos e nos olhos, onde quer que esteja em seus momentos disponíveis – e não apenas diante do computador, numa feição um tanto abstrata e principalmente mecanizada. - O conceito de homossexualismo não se restringe ao pederasta, simplesmente. Os ficcionistas que “capricham” na descrição dos personagens masculinos (posso citar, de relance: Homero, Goethe, Thomas Mann, Wilde, Gide, Cocteau, Joyce, Lawrence, Whitman, Proust, Gide, Borges, Machado de Assis, Cervantes, Guimarães Rosa), evidenciam a “elegância” dos gestos e das ações e feições dos homens e não apenas das mulheres. Ao contrário dos empedernidos machões de plantão, que “divinizam” o que chamam de sexo frágil e “demonizam” seus parceiros, os outros autores teriam uma tendência complacente, quase feminista (ou aqueles camuflam a mesma tendência com a virulência de um porco chovinista?). Conheci um rapaz “assumido”, que sempre respondia a quem estava na dúvida sobre a sua propensão, com as palavras: “sou, sim – e quem não é?” Na situação de um simples leitor, prefiro os autores “isentos”, ou seja, os que tratam com a boa vontade e o mesmo espírito carinhoso os personagens de ambos os sexos (que afinal são o princípio, o meio e o fim da mesma sexualidade). - René Descartes é cartesiano é demais, racional demais. É o dono da razão (e com toda a razão?), não deixa nem um pouquinho de dúvida para o leitor questionar, levar para o momento de avivar a mentalidade. Não me furto aqui da tentação de anotar minhas ilações leiturísticas que fiz até a página 55 no livro de 143 páginas. Depois eu conto o restante? O livro é “As Paixões da Alma” (Coleção Grandes Obras do Pensamento Universal – 6, tradução de Ciro Mioranza, editora escala, São Paulo, SP, sem data). - Respirar e aspirar: um pouco de nossa alma que vai e que vem. Vai para diminuir o excesso; vem para suprir a escassês. De vitamina polivalente! - O corpo e a alma: as diferenças inseparáveis. A união harmônica resulta na felicidade. - A alma perde seu alojamento quando o corpo esfria na morte. - É belíssimo o sistema fluvial da circulação do sangue no corpo: os riachos que banham as cavidades, alimentando-as de vigor e delas recebendo impulsos para a contínua rotatividade da vitalização. - Os dois braços da alma manejam os pensamentos, mormente os que se referem às ações da alma e às suas paixões. - A sede da alma é uma glândula instalada no cérebro. Movida pela alma a glândula impele o espírito através dos nervos, passando aos músculos, movendo os membros. - Um objeto externo assustador pode causar medo, pode também excitar a ousadia e a coragem. - O desejo é o caminho das ações da alma. - O significado das palavras que desejamos dizer é que movimentam nossa língua e nossos lábios. - Há mais segurança na defesa do que na fuga; – e alegria no vencer em vez do pesar e da vergonha de ter fugido. Finalizando, por ora, as inferências, posso dizer, admirado, que existem novidades muito e tão antigas. A leitura do bom livro é sempre conflituosa. Muitas vezes o leitor fica sem saber se já sabia ou se apenas tinha esquecido do que agora está reavendo. O ponto nodal da importância é dado no momento físico da leitura? Entre o céu e a terra..., como diria Shakespeare, outro autor hetero, ou melhor, bi-sexual no melhor dos sentidos.

OS RETALHOS DO TECIDO II

- Jarbas Vasconcelos, na corajosa entrevista concedida à Revista VEJA, vai diretamente à raiz da danosa popularidade do Lula. Segundo disse: “o Bolsa Família é o maior programa de compra de votos do mundo”. Falou e disse. Doa a quem doer. - Os adolescentes de hoje estão sem horizontes plausíveis, despreparados para uma saudável vida adulta? A passagem da adolescência para a juventude (que está a um passo da maturidade) sempre foi uma espécie de rito crucial na vida das pessoas. É o preâmbulo da assunção de uma responsabilidade implacável, quando a pessoa começa a perder a guarida familiar e terá que enfrentar com as próprias pernas a aguerrida luta da sobrevivência, sem cair nas mãos do calango, como se diz, ou seja, mergulhar na angústia e pairar na tensão, precipícios que poderão causar a escorregação rumo aos vícios da alienação. É um fato novo que se apresenta em nosso tempo. Nós (parentes, amigos e conhecidos) de uma geração menos periclitante, conhecemos a barra pesada que é conseguir um bom estudo e um bom emprego para nossos filhos. Se conseguimos é porque contamos com eles no enfrentamento de uma barra ainda mais pesada: eles mudaram de clima, de hábitos e de comportamento, visando um êxito que só dependia do esforço deles mesmos. E agora? Agora a tônica comportamental de toda a sociedade humana adquiriu uma guinada desvinculando os jovens dos mais velhos. Os filhos desgarram-se da tutela dos pais, que assim perdem a “autoridade” sobre eles, uma vez que agora quem ”manda” nas crianças e nos adolescentes é a cultura virtual online, com a multiplicidade de seus jogos e ocupações alienantes. O que resultará dessa nova escolaridade empírica, ninguém sabe. O que sabemos é que o futuro da humanidade não pode ficar assim a deus-dará, entremeado de crises políticas, econômicas e existenciais. - J. R. Guzzo, depois de retratar fielmente a figura hedionda do deputado Edmar Moreira, em sua coluna da Revista VEJA (edição de 18/02/09), amplia o foco com as palavras: “uma pesquisa realizada algum tempo atrás revelou que o bicho que os brasileiros achavam mais parecido com os políticos era o rato – um duro golpe para os ratos, animais que já tem sérios problemas de imagem junto à opinião pública e realmente não precisavam de mais essa”. - Saudades da música popular brasileira, que hoje até que pode ser popular e brasileira (no seio da adolescência e da juventude), mas música mesmo não é mais nem de longe. É uma trovoada de sons sem ritmo, sem melodia, sem harmonia, despida de sensibilidade e de inteligência As (im)possíveis canções e seus compositores e intérpretes fazem o estardalhaço numa espécie de complô festivo de liberação dos instintos e dos costumes tradicionais. Sentimos saudades do comedimento e da sinceridade artísticas e intelectuais dos compositores da chamada velha guarda: Noel Rosa, Heitor dos Prazeres, Ary Barroso, Dorival Caymi, Cartola, Herivelto Martins, Lupiscinio Rodrigues, Pixinguinha, Luiz Gonzaga, Ataulfo Alves, entre tantos outros músicos autênticos. E saudades dos inesquecíveis intérpretes: Francisco Alves, Orlando Silva, Carlos Galhardo, Aracy de Almeida, Dircinha Batista, Silvio Caldas, Jorge Veiga, Dalva de Oliveira, Ângela Maria, Lúcio Alves, Linda Batista e tantas outras e outros. As canções nasciam, cresciam e viviam na boca e no coração das pessoas em todos os quadrantes do país, anos seguidos, entoadas e disseminadas nas vozes díspares e dispersas em toda parte alcançada pela radiofonia. Atuavam fundamente na vivência, no despertamento consciencioso e na coroação dos desejos e das satisfações de um amor humano amplamente refletido e distribuído – perdurável no sentimento e no pensamento das pessoas, indistintamente. E hoje? Hoje sentimos saudades da aquela fase áurea, que foi belamente completada na floração de novos compositores e cantores da grandeza e da estatura de Antônio Maria, Vinicius de Morais, Tom Jobim, Maisa, Bôscoli, Nara Leão, Vandré, Elis Regina, Maria Bethânia, Milton Nascimento, Adriana Calcanhoto, Jamelão e tantos outros e outras astros e estrelas, que iluminavam a vida interior das pessoas e não apenas da “galera” e da claque monetariamente orquestrada. - “Os números da obesidade no país já superam os da desnutrição” – este é o título de um texto publicado na revista da FORLUZ (plano de saúde dos empregados da CEMIG). Que acrescenta: “40% da população está com excesso de peso”. Excesso que na verdade quer dizer doença e não apenas peso. O problema está criado e é muito sério, pois engordar é fácil, difícil é emagrecer. Como sair da balança sema cair?

FOLCLORE PORNOGRÁFICO

A área das instalações sanitárias masculinas do Clube da elite social tem os cômodos mais privados, cada um com seu vaso, seu botão de descarga, seu rolo de papel higiênico, o quadro negro com o giz para receber as anotações dos pilantras. 

Os mais expressivos que vi são:  

1 – Não adianta sacudir a pingola, pois o último pingo é sempre da cueca. 

2 – Cuidado! Mais de três balangadas é considerado punheta. 

3 – Neste cantinho solitário, o orgulho não se acha: todo covarde faz força, todo valente se agacha. 

4 – Se merda fosse dinheiro, o pobre teria nascido sem ânus. 

5 – Ó que latrina mais porca! Recanto mais fedorento! Toda hora cagam fora, raramente cagam dentro. 

6 – A mulher do Godofredo (aquele pulha bandalho), é como o vento no coqueiro, só vive quebrando galho. 

7 – Merda não é tinta, dedo não é pincel. Procure logo o chuveiro, que parede não é papel. 

8 – Três coisas que a mulher faz e o homem não: Chora sem ter razão, urina sem pôr a mão e mete sem ter tesão.