segunda-feira, fevereiro 27, 2012

GOTAS DE ÁGUA NAS FOLHAS DO INHAME

1 – Enquanto a maioria da população das grandes cidades brasileiras for constituída de cidadãos (pessoas normais) e não de marginais (pessoas anormais), as vias públicas serão normalmente transitáveis por deus e todo o mundo, como se diz. Quando tal liberdade de ir e vir deixar de existir – o que já acontece em muitas cidades – as pessoas normais ficam impedidas de transitar livremente nas artérias públicas, sob pena de serem atacadas e feridas moral e fisicamente. E assim, paradoxalmente, os inocentes ficam confinados e os pecadores libertados. 

 2 – Conheço uma casa na cidade, de amplo quintal cultivado de árvores frutíferas, inclusive três enormes pés de mangas chamadas de Coquinha, Espada e Rosa. Outro dia um visitante entusiamado verificava (chupando as frutas) qual delas seria melhor do que as outras. Experimentou a Espada e deu a nota: “é a melhor do mundo, tem gosto de infância na roça”. Depois, debaixo do pé da Coquinhas, ao chupar uma delas, bem madurinha: “esta é ainda melhor, é única no gênero, incomparável na doçura do tecido que fica entre a casca e o caroço”. Depois, sob a sombra da enorme árvore da Manga Rosa, ele complicou ainda mais o sentido de seus julgamentos: “esta, mal-comparando tem o gosto dos beijos de minha primeira namorada que, por coincidência, ostentava o lindo nome de Rosa dos Anjos... esta é a melhor de todas, pode escrever aí em seu caderno de poesia”. 

3 – É inadmissível, segundo Roberto Civita, que um país continental como o Brasil “continue sendo administrado por caciques políticos sem preparo, competência ou conhecimento específico, muito mais empenhados em fortalecer suas máquinas partidárias para a próxima eleição do que preparar o País para a próxima geração”. 

4 – “A felicidade humana não faz parte dos planos do Criador” – Freud falou e escreveu. 

5 – Numa sociedade historicamente machista como a nossa a emancipação feminina nunca é tacitamente aceita nem será definitivamente resolvida. As mulheres que se acautelem, que façam e aconteçam nas áreas historicamente encampadas pelos homens: política, justiça, administração, liderança, o trabalho leve e pesado em todas as áreas necessárias ao encaminhamento da paz e da felicidade sociais. A igualdade ainda depende da solução de muitos problemas, excetuando, é claro, os eventuais problemas das desigualdades da natureza humana. Mas, nesse caso, viva a desigualdade! 

6 – Ainda há muita divindade em Israel. O fragmento que segue foi possibilitado depois de ver as imagens de um e-mail remetido pela amiga Rita de Cássia Pereira da Silva, a quem muito agradeço. Ainda se vê pelos campos e ruas as figuras emblemáticas de Raquel e Jacob, de Rute e Débora, de David e Betzabá, de Jesus e Maria Madalena, de Maria e José! Os muros, alicerces e oásis ainda estão intactos? O Jardim das Oliveiras ainda florido? O Calvário de Gólgota ainda na encruzilhada dos caminhos? E o Sinédrio das agruras e da paixão? E os indícios da ressurreição? E a prevalência do amor ao próximo, nos semblantes dos seres vivos? Ainda se vê o sinal da mão divina ao longo do que se vê: a velha terra arenosa prenhe de vigorosas raízes, o sol e a neve temperando as aclimatações, os templos e o Templo de Jerusalém! Ainda se ouve a súplica das pessoas de bem: que o Senhor aplaque a ira de Caim e Abel; que amenize as refregas e suprima os holocaustos; que a menção profética dos patriarcas e das matriarcas transpareçam nas ações das Doze Tribos abençoadas e também nas profecias e pregações de João Batista e dos Apóstolos, perpetuando os sentimentos e as mentalizações das pessoas; que a coligação dos Testamentos inspire e acione as súplicas pelas boas graças caindo em solo fértil no esforço universal da bela e veraz comunhão dos bens celestiais, ainda agora e sempre tornados terrenos e cotidianos. 


quinta-feira, fevereiro 23, 2012

FREUD, AINDA E SEMPRE

Compilação de Lázaro Barreto do livro “FREUD – Uma Vida Para o Nosso Tempo” - Edit. Cia das Letras, SP, 1989). 

Página 53: “Preocupava-se com todos os beijos que não podia lhe dar, por estar tão distante. Numa carta, justificou seu vício pelos charutos, atribuindo-o à ausência da noiva: fumar é indispensável se não se tem nada para beijar”. 
Página 68: “uma ponta de verdade se esconde por trás de toda sandice popular”. 
Páginas 73 e 74: “pode-se assumir como sabido que a neurastemia é uma conseqüência freqüente de uma vida sexual anormal”. Ele sabia da existência de uma tendência hereditária, mas a neurastemia adquirida tem motivações sexuais. 
Página 113: “Os sonhos traumáticos, que evocam acidentes recentes ou traumas infantis... eles também cabem na teoria do sonho como realização de desejos, na medida em que encarnam o desejo de dominar o trauma, elaborando-o”. 
Na página 133, a citação de uma quadra do poeta Arthur Schuitzebr: “Sonhos são anseios desprovidos de coragem\ Desejos insolentes que a luz do dia\ Encurrala no canto de nossa alma\ E dali, apenas à noite ousam rastejar”. 
Na página 131 consta: “Temeroso de paixões desenfreadas, o mundo considerou necessário, durante toda a história de que se tem registro, rotular os mais insistentes impulsos humanos de mal-educados, imorais, ímpios”. 
Na página 146 consta: “todos os seres humanos são inatamente perversos; os neuróticos, cujos sintomas constituem uma espécie de contraparte negativa das perversões, apenas expõem essa disposição primitiva universal de modo mais enfático do que as pessoas “normais”.... 
“A aptidão para tal perversidade é inata”, ele acrescenta na pág. 148. Para amenizar a opinião freudiana, Peter Gay acrescenta: “a generosa concepção da libido, sustentada por Freud, converteu-o num democrata psicológico: como todos os seres humanos participam da vida erótica, todos os homens e mulheres são irmãos e irmãs por baixo de seus uniformes culturais”. 
Na pág. 162: “Em seu artigo sobre a moral sexual civilizada, ele observou que a civilização moderna faz exigências extraordinárias à capacidade de contenção sexual; requer que a pessoa abstenha de relações até o casamento e, a seguir, restrinja sua atividade sexual a uma única parceira. A maioria dos seres humanos, pensava Freud, acha impossível obedecer a tais exigências, ou obedecem-nas a um custo emocional exorbitante. 
Pagina 193: “Jung contestava Freud? Não. A única maneira legítima de contestar Freud é reproduzir seu trabalho. Caso contrário “não se deveria julgar Freud, pois não estáse agindo como aqueles famosos cientistas que se recusavam a olhar pelo telescópio de Galileu.... Para ele a religião era uma necessidade psicológica projetada na cultura: o sentimento de desamparo infantil remanescente no adulto, deveria ser antes analisado do que admirado”. 
Pág.243: “uma neurose nunca diz nada de tolo, como tampouco um sonho. Sempre repreendemos, quando não entendemos. A psicanálise é a arte e a ciência de escutar pacientemente”. 
Pag.272: “Durante a fase edipiana surge a experimentação e a instrução no domínio do amor, quando a ternura sem paixão é amizade e a paixão sem ternura é luxúria. É preciso harmonizar essas duas correntes”. 
Pág. 275: “A vida sexual não se resume no coito, mas estende-se a domínio muito mais amplo e diferenciado de sentimentos conscientes e impulsos inconscientes”. 
Página 282: “O tratamento psicanalítico está fundado na honestidade”. 
Pg. 287: “Ao brincar, a criança leva as coisas muito a sério, mas sabe que o que está fazendo é uma invenção. O oposto da brincadeira não é a seriedade, mas a realidade”. 
Pág. 288: “de muito tempo para cá, o que tem sido decisivo não é a beleza física de uma moça, mas antes a impressão de sua personalidade... O que os rapazes razoáveis procuram numa mulher: temperamento meigo, jovialidade e a capacidade de tornar a vida mais agradável e fácil para eles”. Pag.307: “A morte do pai e a conquista da mãe: assim, oprimidos pela culpa, os filhos instauraram os “tabus fundamentais do totemismo, que deviam corresponder exatamente aos dois desejos reprimidos do Complexo de Édipo. Ao se tornarem culpados e reconhecerem sua culpa, eles criaram a civilização. Toda sociedade humana está construída sobre a cumplicidade num grande crime”. 

Recomendo a leitura de ”ÉDIPO REI”, a imortal tragédia de Sófocles.

segunda-feira, fevereiro 20, 2012

O CASARÃO QUE MUDOU DE LUGAR

O casarão do meu bisavô paterno, imponente e faustoso, era, na minha infância do Desterro, uma das edificações remanescentes da época áurea do colonialismo brasileiro. Construído sobre um alicerce de três metros de altura, exibindo na frente e nos fundos uma escadaria cimentada de muitos lances, de tal maneira que propiciava um espaçoso porão que servia de senzala para abrigar dezenas de escravos de ambos os sexos. A escravidão, na época, era o braço movido pela vontade dos proprietários. Os escravos cuidavam do curral, do chiqueiro e da manga dos porcos, dos pastos e roças e da provisão de mantimentos e madeiras e lenhas de serventia de tapumes e fogões de cozinha. Sabe-se hoje, em estudos de pesquisa científica, que naquela época os escravos não eram tratados humanamente, mas como reles autores de mão de obra a serviço da classe dos proprietários rurais e dos grandes e pequenos comerciantes das vilas e arraiais. Eram vendidos e comprados em todas as oportunidades e necessidades a preço muito alto. Mesmo assim a classe pobre dos brancos não renunciava ao direito de possuir um serviçal para toda obra, em qualquer circunstância, com as a obrigações, inclusive, de carregar, descarregar e lavar os urinóis dos familiares da casa e higienizar as latrinas e banheiros nas residências dos mais abastados. Assim sendo o escravo de um pessoa rica sofria menos do que o das pessoas pobres. Essas quotizavam-se para comprar um escravo, o qual passava a servir a dois, três, quatro proprietários na proporção de tantas horas por dia para cada um. Assim o pobre coitado trabalhava dia e noite em três, quatro, cinco casas, carregando lenha e água, lavando roupa, limpando tudo e fazendo tudo que cada um de seus donos mandasse. O casarão e seus pavimentos e seus adereços: mobiliário importado, juntamente com os relógios de paredes, as imagens sacras, os castiçais, lampiões e lamparinas, as camas de dosséis, cadeiras de palhinhas, prataria e talheres de porcelana e cobre, os pisos em mosaicos nas paredes e alpendres, os fogões de ferro fundido, alimentados de lenha e carvão, com as chaminés enfumaçadas, e outros requintes da residência aristocrática. As mulheres em suas sedas, linhos e cetins, colares e anéis e sandálias de luxo; os homens com suas botinas, brins e casimiras, chapéus e relógios de algibeiras. O terreno conexo ao casarão começava depois da escada que chegava ao terreiro e às áreas de secar café, feijão e arroz, ladeadas por bicas de água potável – e à certa distância os paióis, o galinheiro, o curral, o chiqueiro e a manga dos porcos. Tudo isso num dos lados do quintal; no outro lado frutificavam as árvores de mangas, laranjas, goiabas, bananas, ameixas, uvas, abacates, cajus, jabuticabas e outras espécies. Depois dessa demarcação começavam os terrenos das capoeiras (nascentes das águas) e das pastagens, a sumir de vista. O dono era, então, poderoso e rico. Passou o tempo, levando a vida das pessoas, modificando os usos e costumes, trazendo as novidades e o aumento da população mais pobre. Lembro-me, ainda em criança, da época do casarão em processo de decadência, alugado a um casal sem filhos, egresso da civilização: ele um perito em vários ofícios: relojoeiro, sapateiro, ferreiro, barbeiro; e ela, fogosa e bonita, apenas cuidava da casa, com uma particularidade: não usava roupa de baixo – e assim fazia a festa sexual da meninada masculina que, com a desculpa de caçar biloscas e frutas no quintal, adentrava a área do porão e de lá, cada um mais embevecido que o outro, ficava debaixo das gretas do soalho, namorando as “partes” da mulher, andando no meio das inumeráveis frinchas da parte de cima do tabuado. Assim passava o tempo, até que um dia, chegou um bitelo de um caminhão procedente da cidade de ITU, estado de São Paulo, com um senhor identificado como o novo dono do casarão (isso muito depois do falecimento de meu bisavô). Ele e seus ajudantes tiraram fotografias de toda a casa, parte exterior e interior e telhado, nos mínimos detalhes, incluindo toda a parafernália de quadros, esculturas e objetos de serventia. Fotografaram toda a edificação e logo começaram, jeitosamente, a retirar todo o material (pedras, tijolos, madeiras, telhas e tudo que ainda restava no prédio) e acomodá-lo na enorme carroceria do caminhão. Concluído o enorme trabalho o caminhão partiu na direção da cidade paulista , onde o comprador (segundo as palavras dele) ia remontar o casarão, tal como era na origem. Estive outro dia lá na grande e bela cidade paulista, para ver se encontrava a casa transplantada, mas não consegui. A cidade é enorme, some de vista. Mas conserva elegantemente muitas edificações em estilo colonial. Voltei encantado com a cidade, mas sem encontrar o que procurava com tanta saudade.

A VIDA HUMANA

Se estou vivo, Das duas alternativas, uma: Saudável ou doentio. Se estou saudável, tudo bem. A rotina vital transcorre pelas vias previstas (Os eventuais embaraços são logo ultrapassados). Se estou perrengue, tudo mal (a vida hesita quanto aos rumos a tomar, Fica dependendo de meus órgãos físicos e mentais, Repletos de pontos de interrogação). Assim é, Sem tirar uma vírgula. Estarei sempre na mão e na contramão Das vicissitudes. Haja perspicácia e paciência. Pois é assim mesmo.

sexta-feira, fevereiro 17, 2012

UMA FAMÍLIA, COMO EXPLICAR? (*)

“Onde quer que a gente vá”, como diz o Millôr Fernandes (que falta ele faz no jornalismo brasileiro atual!), “há sempre um passado pela frente”. A Genealogia – viagem da família no tempo através do sangue – desenha uma árvore que cresce e multiplica, apesar das folhas e galhos que secam e caem, cortadas pelo destino, violento ou não. 

É uma atividade lúdica que vai formando a chamada árvore genealógica da família, com suas imagens: as raízes, o tronco, os galhos, os ramos, as folhas, as flores, as frutas, em suas formações verticais e horizontais, através da proliferação de um pequeno núcleo (uma casa que logo se transforma em rua, bairro, cidade) do casal com os filhos, do qual brotam e encompridam-se os galhos paralelos (tios, sobrinhos, primos) e verticais (avós, bisavós, trisavós; netos, bisnetos, trinetos). 

Uma árvore frondosa ou esquálida que cresce ou estaciona ou míngua conforme as qualidades e condições das sementes, do terreno e do trabalho cultural. A contemplação da imagem é sempre agradável à vista e ao coração: os elementos consangüíneos acasalados aos de afinidades resultam numa espécie de homogeneidade na heterogeneidade, na fusão por assim dizer multiplicadora, da qual os sinais gráficos se dispersam na mistura mas não se perdem. 

É assim que depois de cem, duzentos anos, um pentaneto pós-moderno pode ter os mesmos traços físicos e o mesmo nome do pentavô setecentista, apesar das sucessivas bipartições cromossônicas. O quadro, mesmo visto à distância, é aprazível e pertinente, indutor de variadas e contraditórias interpretações: pode dar a impressão de uma aquarela verde-rosa de rebentos bem formados na estruturação psicofísica ou suscitar dúvidas quanto à perícia do desenhista de revelar a verdade que transcende às aparências. 

Uma família é um barco nas águas marítimas, que balança ou plaina de acordo com o tempo. A família é a família e sua circunstância, como diria Santayana. Só é inteira se estiver contextualizada em si mesma, na afinidade de seus membros, e no meio social em que vive. A contigüidade territorial une as pessoas num sentido semelhante ao do parentesco, sem as peias e a hierarquização, numa dimensão de maior independência e familiaridade, apesar de menos sólida. É o produto da chamada horda não-diferenciada da morfologia social de Jay Rumney, uma tendência demográfica dos novos tempos. 

Carlos Drummond de Andrade exprime em versos o condicionamento paisagem\família: “Alguns anos vivi em Itabira, Principalmente nasci em Itabira. Por isso ou triste, orgulhoso, de ferro. Noventa por cento de ferro nas calçadas, Noventa por cento de ferro nas almas. E esse alheiamento do que na vida é porosidade e comunicação”. 

Por outro lado, a herança genética é como um fio condutor, tênue, flexível e resistente, que transmite, no percurso da vida familiar, os sinais de identificação e através deles as características de propensão comportamental. Vale a pena citar Drummond novamente: “Uma família, como explicar? Pessoas, animais, Objetos, modos de dobrar o linho, gosto De usar este raio de sol e não aquele, Certo copo e não outro, A coleção de retratos, também alguns livros, Cartas, costumes, jeito de olhar, feitio de cabeça, Antipatias e inclinações infalíveis: uma família, Bem sei, mas e esse piano?” 

É isto mesmo. Entre a família e o meio social há sempre um piano ou uma orquídea no valo do quintal. O risco da disfunção é sempre iminente. Cada ser humano herda o somatório genético que vem de tempo imemorial, através das gerações, num processo de reciclagem em termos de acumulação e dispersão dos elementos essenciais na formação das novas personalidades. De forma que onde quer que a gente vá há sempre um ascendente na descendência e vice-versa. 

(*) Texto extraído das páginas 205 e 206 do livro “Família Oliveira Barreto”, Edit. Express, Divinópolis, MG, 2005 (esgotado) de autoria deste escritor.

domingo, fevereiro 12, 2012

DOIS LIVROS PRECIOSOS

1 – 60 Anos de Festival de Cannes (1946-2006) Este livro de luxo, que me foi presenteado pelo filho Paulo e a nora Layla, é uma festa para os olhos e o coração de um inveterado cinéfilo. Legítima expressão documental da fase áurea do cinema internacional, caprichoso repertório das obras primas do Cinema, fartamente e lindamente ilustrado com as fotos coloridas de cenas dos filmes e dos festivais, exibindo a galeria dos melhores astros e estrelas das seis décadas mencionadas. Senti-me em casa, como se diz, muito à vontade, folheando, lendo e vendo as magníficas e saudosas imagens de tantos filmes vistos ao longo do tempo. 

2 – COTE D´AZUR. Outro livro de luxo, para guardar carinhosamente ao longo do tempo (presente também do casal referido, na volta deles de uma segunda lua de mel, agora na faixa belamente turística da Europa). A maravilha da paisagem natural, deliberadamente preservada ao longo do tempo. Dir-se-ia que estamos folheando as páginas do paraíso mais realista deste mundo. Mesmo na área habitada transparece uma espécie de eterna juventude, sem o menor sinal de poluição. A lua parece um sol e vice-versa na Baie de Saint-Tropez, sem falar nas fachadas do casario. O festival das cores mais puras das buganvilhas em Port-Grimaud. A suntuosidades das imensidões, as pedras dormindo ao sol, os campos elísios em toda parte, o panorama suntuoso da baia de Cannes... E as praias de Cannes? E os jardins? Depois vem os cenários de Antibe, Biot, Grasse, Vence, Nice, a Baia dos Anjos.... A naturalidade da fantasia, a realidade dos sonhos. E assim prossegue o passeio pelas 160 páginas em papel e dimensões especiais. Um colírio para os olhos, uma inspiração para o casal Paulo e Layla, moradores da aprazível Vila Verde do Estado de São Paulo. Um presente de ouro e diamante para esse inveterado leitor e cinéfilo.

A RECONHECIDA GENIALIDADE DE GTO

GTO (Geraldo Teles de Oliveira), nascido em Itapecerica, criado e falecido em Divinópolis, é um escultor - na abalizada opinião da artista e escritora portuguesa Ana Hatherly - mais importante do que o Aleijadinho, uma vez que o mestre da arte barroca seguia uma noção estilística de antepassados, enquanto que GTO iniciava um novo estilo, que o crítico Roberto Pontual chamava de “primitivo e criador’. 

O grande artista, que honra o renome de celeiro de talentos criativos de Divinópolis, mereceu agora uma homenagem digna de um verdadeiro detentor de indiscutível imortalidade. Refiro-me à Exposição (bela, grandiosa) que o SESC Minas Gerais, realizou em Belo Horizonte com a justa ênfase de um reconhecimento inquestionável. 

Tenho o prazer de citar os mentores e realizadores do magnífico evento: Jorge Cabrera Gómez (Diretor de Cultura SESC Minas), Faber Clayton Barbosa (da Secretaria de Cultura de Divinópolis), Rodrigo Viva, Lázaro Luiz Gonzaga, Marcela Yoko, Luciana Félix, Lidia Mendes, os fotógrafos e cinegrafistas Erwin Oliveira, Déa Tomichi, Fábio Belotte e outros abnegados e competentes produtores de arte legítima. 

O título da Exposição “Um Dia a Árvore dos Sonhos Inopinados” foi inspirado num poema de minha autoria, notavelmente reproduzido através de declamação, imagens e reprodução (originalíssima) no corredor de uma das paredes brancas. 




O poema é o que se lê abaixo. 

 A ÁRVORE DOS SONHOS
Um dia a árvore dos sonhos inopinados 
Desabou na cabeça do escultor GTO, 
Que logo começou a vazar 
O ouro das dívidas e das imaginações: 
A dança dos ícones nas gravuras parietais 
A agoniada prateleira dos ex-votos 
O balaio das miniaturas e das ampliações 
A escalação dos totens, manipansos e penitentes 
A montanha devocional das tribos indígenas 
As efígies serôdias de Assubarnipal e de Araribóia 
Os perfis enfiados dos heróis da história-pátria 
Os ritos de passagem dos velhos arraiais 
 A acrobática peleja grupal dos roceiros.

As entidades espirituais escorregam de suas mãos 
Em sombria, quase opaca luz dos transes 
Que anima os traços e relevos da matéria-prima. 
Assim Da fratura dos troncos avermelhados saltam
Os guerreiros corporais nas rodas e labirintos 
As etnias as classes as mandalas e oroboros 
Os símbolos imemoriais de nossa caminhada 
É assim que ele tenta regressar à pureza 
Que o quer, lá na frente. 

E lá um dia os galhos e ramos da árvore Atávica 
Brotam em suas mãos primitivas e criadoras 
Assim ele pode sacudir a sina (e para não endoidecer 
Nas horas traumáticas do dia-a-dia), e assim ele 
Expulsa os demônios do corpo! 
Assim ele mergulha na pureza para saber 
Que não existe erro na face da terra


NOVOS POEMAS

1 – As Palavras. 
Preciso devolver ao jargão corriqueiro As palavras obsoletas? Transferi-las da inocuidade do monólogo Para a loquacidade do diálogo? Preciso surrupiá-las do dicionário (limbo imobilizado ao alcance dos apressadinhos), 
Escondê-las nos bolsos do corpo e do espírito? Preciso reconduzi-las aos ermos temerários: Pinçar um barbarismo aqui, Um arcaísmo ali, Acordá-las da sonolência embaraçosa, Reavivá-las no fogo de meus diuturnos Serões? 

2 – Claridade Difusa. 
Alguém me disse (não me lembro quem nem quando nem onde): Evite os poemas de circunstâncias E de encomendas. A vida é um poema, um problema. A sombra esconde a luz no emaranhado Das chamadas palavras difíceis As páginas em branco são os dias e os lugares Nos quais tantas coisas e seres Aparecem e desaparecem. Os apelos da morte definitiva nos dias transitórios Chamam, reclamam, enganam. 

3 – Sorrisos Femininos. As axilas são as extremidades Do sorriso horizontal Nas mulheres que amamos. As virilhas são as extremidades Do sorriso vertical Nas mulheres que amamos. 

4 – Hermetismo. A orquídea é andrógina, apesar de feminina. A promessa do amor impossível é uma sombra na parede? Você pode abraçar o luar, mas não a felicidade: Assim Sansão, enganado, diz à Dalila, enganadora. É preciso ter chaves especiais para abrir As portas do céu que certa moça tem... Quem teve a bondade de dizer-me assim, Numa agora esquecida leitura? O orgasmo é melhor quando as centelhas Do fervor regressam à alma apaixonada E brilham, Brilham sem parar. O sabiá canta na moita de araçás, Subitamente eriçada, No doce sitio do amor acordado Nas derrapagens do sigilo atordoado. E agora Como processar as idéias embutidas nos neologismos Do hermetismo, Com tantos silogismos dispersos no ar da tarde De minha tórrida divagação?