terça-feira, maio 27, 2008

PRETÉRITO PERFEITO

No tempo das maitacas (as vertigens os psilos) no tempo das águas agosto ventava setembro floria outubro chuvava novenbro chovia dezembro jabuticava janeiro vazava fevereiro acabava No tempo das gabirobas (as siriricas e tanajuras) no tempo da seca rute luzia raquel tomava água do jordão sara partejava maria subia o monte sião leda chorava lívia lá ia devanir morria No tempo das águas (as goteiras e os bagres) no tempo das aulas (alfavacas e ciganos) (cataporas e varicelas) Esperança e (saudades).

sábado, maio 24, 2008

O POVO BRASILEIRO, A VELHA A FIAR

Uma nova versão da cantiga “A Velha a Fiar”. 

• Estava o Povo em seu lugar 
• Veio o Português lhe fazer mal. 
• O Português no Povo
• E Povo a fiar. 
• Estava o Português em seu lugar 
• Veio o Holandês lhe fazer mal. 
• O Holandês no Português, o Português no Povo 
• E o Povo a fiar... 
• Estava o Holandês em seu lugar 
• Veio o Nativo lhe fazer mal. 
• O Nativo no Holandês, o Holandês no Português, o Português no Povo 
• E o Povo a fiar... 
• Estava o Nativo em seu lugar 
• Veio o Império lhe fazer mal. 
• O Império no Nativo, o Nativo no Holandês, o Holandês no Português, o Português no Povo 
• E o Povo a fiar... 
• Estava o Império em seu lugar 
• Veio a República lhe fazer mal 
• A República no Império, o Império no Nativo, o Nativo no Holandês, o Holandês no Português, o Português no Povo 
• E o povo a fiar... 
• Estava a República em seu lugar 
• Veio a Ditadura lhe fazer mal. 
• A Ditadura na República, a República no Império, o Império no Nativo, o Nativo no Holandês, o Holandês no Português • O Português no Povo 
• E o Povo a fiar... 
• Estava a Ditadura em seu lugar. 
• Veio a Corrupção lhe fazer mal. 
• A Corrupção na Ditadura, a Ditadura na República, a República no Império, o Império no Nativo, o Nativo no Holandês, o Holandês no Português, o Português no Povo 
• E o Povo a fiar... 
• Estava a Corrupção em seu lugar 
• Está a Corrupção em seu lugar 
• E o Povo a fiar
• E o Povo a fiar 
• E o povo a fiar... 


O PREFÁCIO DAS AQUARELAS

aquarelas painéis e mandalas tudo provém do amor pluralista e panteísta da sacrossanta natureza de nossas minas generalizadas é necessário, pois projetar e salvar o jornal Aldrava, de Mariana e os mapas geológicos e genéticos da flora e da fauna com todo o florilégio de éclogas bulícios pastorais idílios os resquícios da mata atlântica e das faíscas lunares (a beladona da família das solonáceas!) todas as águas correntes e paradas da biodiversidade incomparável do Ribeirão do Carmo esparramadas nas esplanadas do céu e da terra com seus aclives e declives e todos os grãos e brotos e relvas e árvores egressas do éden mais generoso replantado e renascido no Novo Testamento em forma de palavras de amor-amor-amor e tantos biótipos pululantes no chão e no ar! tantos templos de sonhos inescrutáveis nos trechos encachoeirados do rio das itapecericas com suas regiões rurais apensas aos ouros e águas frias dos lavapés e cacocos das pedraças e os morros das onças e das lavrinhas do perene mourejar dos filhos de Deus.

sexta-feira, maio 23, 2008

NEW YORK, NEW YORK

A vista aérea de Nova Iorque, focalizando num mesmo olhar o contorno marítimo e um dos núcleos centrais da metrópole, é algo de uma leveza grandiosa, com as nuances de uma abstração colorida suavizando a concretude das edificações verticais até aos horizontes nublados, quase submersos na invisibilidade. Em 1660 a uniformidade quase rasteira do casario na Ilha de Manhattan demarcava o sítio emblemático do surto tecnológico dos séculos futuros, propício à aglomeração habitacional de milhões de seres humanos irmanados em métodos comportamentais essencialmente pragmáticos e democraticamente cristãos. A reconstituição da Capela de São Paulo, na Broadway é perfeitamente afinada no zelo, no gosto, no amor da tradição do amor humanamente poético. O livro “NEW YORK - The Growth of the City” (Chartwell Books, Inc., New Jersey, 2007), descreve e narra a vida de uma cidade através do caprichoso mostruário do relevo arquitetônico suavizado por linhas curvas e filigranas e toques e miniaturas que amenizam o arrojo gigantesco com as lentes munidas de cores e gradações agradáveis a todos os olhares. As obras de arte pictóricas da arquitetura genérica remontam ao século XVII e, ao contrário das emblemáticas cidades-museus européias, não puderam ser conservadas, foram derrubadas pela sede e pela fome do progresso tipicamente norte-americano. Mas foram reconstruídas através da observância da memória pictórica, com o zelo artístico e a perícia técnica alcançadas pelos fabulosos recursos da tecnologia moderna. De forma que, no livro, a impressão em páginas contíguas (paralelas), confirma o êxito da real evocação de um passado que tanto influi na construção de todas as fase do futuro. As páginas 67 a 71, destinadas à visualização do Central Park, brindam os olhos do leitor com as múltiplas facetas da comparação estética entre as áreas naturais e as construídas. O observador fica na dúvida e aqui opta pela primazia da natureza tão viva e palpitante e ali julga que uma parte embeleza a outra ou fica mais bela assim fisicamente irmanada à outra. A foto panorâmica da página 67 não deixa dúvida: o parque florestal é mais aprazível e mais fluente, mais descansativo mentalmente. Nas outras páginas, onde a mão humana cumprimenta (por assim dizer) a mão da natureza, o leitor aprova a plausibilidade da fusão, sentindo que o arvoredo e o lago dão um sentido ampliado da beleza à ponte, ao barco e ao prédio artisticamente desenhado e construído, que detém, em seus interiores inimagináveis emblemas, sortilégios e preciosidades. A Brooklyn Bridge é, além do valor de comum serventia, uma verdadeira obra de arte pela finura de seus traços que envolvem e encobrem o arrojo da argamassa das alvenarias. E a Estátua da Liberdade, repleta de ícones da modernidade da civilização novomundista das Américas? E o recorte maravilhoso da gótica Catedral de São Patrício na Quinta Avenida? E o Jardim Botânico com seus festivais de flores e de cores desde 1891? E a George Washington Bridge, de 1931, de tal modo extensa, que nem coube no paralelismo de duas páginas? E depois vem o também emblemático Empire States Building, também construído em 1931, cenário de belos e memoráveis filmes? Etcétera e etcétera, sem falar nos outros tantos sacrários urbanos da Broadway, do Wold Trade Center (in memoriam), da Brooklyn Bridge, do Rockefeller Center, do Hayden Planetarium, do Metropolitan Museum of Art, do Madison Square Gardens, todos (e muitos outros) perfeitamente explícitos nas 160 páginas de autêntica poesia viva do livro.

quinta-feira, maio 22, 2008

O BRASIL DOS ÍNDIOS

Dando seqüência à nossa sintética (e singela) demonstração de alguns aspectos ponderáveis da História do Brasil, valemo-nos agora de um dos livros da série de romances históricos de Assis Brasil (*), 

“PARAGUAÇU E CARAMURU - Origens Obscuras da Bahia” e “VILLEGAGNON – Paixão e Guerra na Guanabara” (Editora IMAGO, RJ, 1999). 1 - O Patriotismo Indígena (conforme está na página 48): “Os índios eram os donos da terra, e os portugueses, intrusos. Claude Lévi-Strauss afirma que “a magia e a ciência são duas formas de conhecimento paralelas, a primeira não antecede a outra nem lhe é inferior”. Eis porque se para os “descobridores” os índios eram “bárbaros”, para os índios os descobridores também eram bárbaros”. 2 –O Tronco das Tribos (página 81): “Os nomes das tribos indígenas do Brasil são outro equívoco dos historiadores, nativos ou estrangeiros. Havia um único tronco na região litorânea (de 1 milhão a 5 milhões de indivíduos), daí a língua geral que falavam e que também iria se modificar com a dissensão de grupos. Os navegadores e descobridores batizaram-nos (os espanhóis) de guaranis e (os portugueses) de tupis. Mas o fato é que todos os selvícolas nessa faixa eram tupinambás (o tronco principal) ou tupis (os guerreiros). 3 – Escravisação (página 226, citação de Benedito Prezia): “Diante da ação avassaladora e incontrolável dos europeus, os indígenas não tinham muito a escolher: fugir para o mato ou aceitar os escravisadores menos ruins”. 4 - A Catequese (pág. 291, citação de Pero Vaz Caminha): “A feição deles é serem pardos, maneiras de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos... Porém o melhor fruto, que nela se pode fazer, me parece que será salvar essa gente, e esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar”. Já o famoso José de Anchieta, aconselha que “para este gênero de gentes não há melhor pregação do que espada e vara de ferro” (pág. 219). E o Primeiro Governador Geral, Tomé de Souza, desumanamente declara que “são tantos os selvagens que nunca conseguiremos terminar com todos eles, nem mesmo que tenhamos que cortá-los em matadouros” (pág. 30). E na página 43 A. Souto Maior faz a ressalva do genocídio: “se não fosse a Companhia de Jesus, o colono português teria dizimado completamente as tribos indígenas”. 5 - A Resistência Indígena: “As lutas entre colonos e indígenas levariam ao fracasso da Capitania Hereditária. O próprio donatário da Bahia (Francisco Pereira Coutinho) morreu trucidado pelos tupinambás” (conforme A. Souto Maior, página 27). 6 – As Virtudes Indígenas: trecho de uma declaração de Américo Vespúcio, transcrita na página 60: “Os índios se banham continuamente e são polígamos e muito zelosos. Não se lhes pode chamar de mouros ou judeus; não lhes vimos praticar nenhum sacrifício e tampouco possuem casas de oração”. A respeito, eis o que diz o Padre Manuel da Nóbrega: “Figura de morena encantada, tipo delicioso de mulher morena e de olhos pretos, envolta em misticismo sexual – sempre penteando os cabelos ou banhando-se nos rios ou nas fontes mal-assombradas” (página 187). 7 – A Magia Deles e Neles: “Algumas flautas, sobretudo as ornadas com desenhos ou gravuras, eram consideradas instrumentos sagrados e tinham poderes mágicos, sendo tabu para as mulheres” (Renato Almeida, página 144). 8 - A Miscigenação:”Os jesuítas conseguiram vencer nos primeiros colonos a repugnância pelo casamento com as índias. Os mais aqui tinham índia de muito tempo de que tinham filhos e tinham por grande infâmia casarem com elas. Agora se vão casando e tomando vida de bom estado” (Padre Manuel da Nóbrega, página 210). 9 - O Papel Positivo dos Piratas: “Não estaremos longe da verdade se considerarmos a disputa francesa a causa principal da colonização da terra descoberta por Cabral. Se não fosse a pirataria dos franceses, talvez o rei português não se lembrasse de colonizar o Brasil” (Manuel Diegues Júnior, página 403). 10 - O Belo Gesto de Villegagnon, Segundo Nicolau Barres, pág. 473: “Homem de bem e temente a Deus, Villegagnon proibiu terminantemente que os franceses tivessem relações com as brasileiras, sob pena de desposá-las, ou morrer”. 

(*) Assis Brasil, famoso escritor piauiense, de projeção nacional, é autor de uma série de romances históricos, de crítica literária e de organização de antologias poéticas nacionais (numa das quais incluiu poemas deste resenhista, que o considera dileto amigo e referência de trabalho intelectual no melhor sentido, ou seja, na importante área de prevalência da verdade e da beleza nas relações humanas).

quarta-feira, maio 21, 2008

APENAS UM CORAÇÃO SOLITÁRIO

Sobrevivente de infaustos percalços sei agora que a dívida que contraí à minha revelia (que tenho carregado, penosamente), acumula juros escorchantes, o que inviabiliza sua amortização. Assim, sem outro valor a dar por conta, afianço aos (im)possíveis credores que o que mais almejo no rol de minhas proposições é a liberdade política (a democracia, sem os encargos da corrupção) e a liberdade poética (o cristianismo, sem as arestas da misoginia). Só assim posso votar nas eleições circunstanciais a favor da Piedade e contra a Violência (os dois nomes originais e autênticos da Poesia e da Política, respectivamente).

terça-feira, maio 20, 2008

MISCELÂNEAS

- A crise política é uma bola a rolar de pé em pé, sempre a marcar seus gols contra. - Pergunta e resposta da mesma pessoa: por que não abraçou o concretismo nem falou mal dele? Porque toda vez que o critico mentalmente, os praticantes dele vêm negritar a página de hermetismos, e assim o diálogo dialético fica impossível. Prefiro deixá-los gravar o nada deles sobre o meu vazio, deixando assim um campo aberto para livres incursões e excursões. - Anedota: a criança afirma: “Mamãe, a senhora está muito acabada!” “Estou mesmo...” A mãe suspira fundo, ao responder. “Mas já fui uma uva, só vendo!...”. “Mamãe, como é que pode? Já vi formiga virar tanajura e siririca, já vi ovo virar galinha, mas nunca vi uma uva virar abacaxi”.... Poemeto?: esse seu outro rosto, de redondidade sedosa e escorregadia, beirando os róseos lados do declive - a redondidade um tanto ou quanto autônoma, como se furtivamente desmendasse do resto do corpo, agora empertigado. A linha de luz nos pés dinâmicos, o volume de oferendas nas mãos. As palavras audíveis e legíveis do olhar, a lícita, a tácita revelação repentina e prolongada, do início de um esclarecimento interligado às rutilantes obscuridades sentimentais. As Crendices Populares: - A cobra ferida se esconde, e escondida fica muitos anos jurando picar a pessoa que a ofendeu. - Quando vai beber água, a cobra deixa o veneno numa folha. Quem encontrar o veneno, e o levar consigo, jamais será ofendido por cobras venenosas. -Matar sapo é chamar chuva exagerada. - A água de mina seca se se matar a jia que mora lá e que é a mãe da mina. Modo de mandar a chuva embora: soprar levemente a mão fechada na direção da nuvem, abrindo-a vagarosamente. - Modo de chamar chuva: soprar levemente a mão aberta na direção da nuvem, fechando-a vagarosamente. - Quando se espirra a alma sai do corpo. É por isso que se diz: “Deus te ajude!” É para que a alma volte ao corpo. - A criança que é pulada, não cresce. - O cão uivando sem motivo está vendo almas do outro mundo. - Na poeira do redemoinho o capeta aparece dançando. - Se a orelha direita queima, alguém está falando bem da gente. Mas se é a esquerda que queima, é porque falam mal. Nesse caso é só morder a barra da camisa que o falador morde a língua e cala. - O desenho do Signo de Salomão na frente da porta da casa espanta a presença do diabo. - Quem dá e depois toma, fica corcunda. - Bater na mãe faz a mão secar. Se você sonhar com a namorada, é só virar o travesseiro que a ela também sonhará com você. - Quem cochicha, o rabo espicha. - Quem deve a Deus, paga ao Diabo. - Quem quer pegar um pássaro, não chega dizendo xô. - Temos que amar a desigualdade. Nem os dedos das mãos são iguais.

DOIS TEMPOS

I Numa manhã de noites femininas, o sol molhado no jorro das neblinas: minha voz responde a outros cantos, só audíveis na vivência dos espantos. Uma estrela em pleno dia que passa sobre o roçado desfeito em fumaça: pergunta ao fazendeiro e ao delegado porque mataram as árvores do cerrado. Passo a passo o vento me acompanha. A hora é cedo na cabeça da montanha. Uma palavra me espera na porteira: é um sigilo de flor na trepadeira. 

II A tarde é ampla e aberta, Quase a noite. O medo se levanta, gritando-me. O gado beira o curral. A sombra de uma palavra Toca o nível da relva, Corta o vôo de um pássaro. Três estacas no brejo Acolhem a tristeza do Jeca. Olha aí a dor, quase a morte Do amor dos seres vivos.

domingo, maio 18, 2008

GUIMARÃES ROSA E ADÉLIA PRADO

Compilação de Lázaro Barreto nos CADERNOS DE LITERATURA BRASILEIRA, Edições IMS – Instituto Moreira Salles (São Paulo, SP) – número de dezembro de 2006 referente à Guimarães Rosa e de junho de 2000 referente à Adélia Prado. 

GUIMARÃES ROSA: Nascido em Cordisburgo, MH, a 27/06/1908, filho de Florduardo Pinto Rosa e de Francisca de Guimarães Rosa, casado em 1930 com Ligia Cabral Penna e em segundas núpcias (em ?) com Aracy Moebius de Carvalho. Faleceu em 19/11/1967, três dias depois de sua posse na Academia Brasileira de Letras. Médico, funcionário público e como diplomata trabalhou na Alemanha durante a guerra mundial (salvando muitas vidas de judeus através dos bons ofícios diplomáticos), e depois em Bogotá. Principais publicações: SAGARANA, contos, em 1946; CORPO DE BAILE (contos) em 1956); GRANDE SERTÃO: VEREDAS (romance) em 1956; PRIMEIRASS ESTÓRIAS (contos) em 1962; TUTAMÉIA (contos) em 1967. Publicações póstumas: ESTAS ESTÓRIAS (CONTOS) EM 1969; AVE, PALAVRA (contos) em 1970; MAGMA, em 1977. 

ADÉLIA PRADO: Nascida em 13/12/1935, filha de João do Prado filho e de Ana Clotildes Corrêa; casada com José Assunção de Freitas; formada em filosofia em 1973. Publicou seu primeiro livro LAPINHA DE JESUS (editora VOZES, de Petrópolis, RJ, em 1969, de parceria com Lázaro Barreto, que havia publicado seus primeiros poemas no jornal literário AGORA, de Divinópolis, MG. Principais publicações posteriores: BAGAGEM, 1976; O CORAÇÃO DISPARADO, 1978; SOLTE OS CACHORROS, 1979 (ano em que encena a peça O CLARÃO, escrita em parceria com Lázaro Barreto); CACOS PARA UM VITRAL, 1980; TERRA DE SANTA CRUZ;1983; OS COMPONENTES DA BANDA, 1984; em 1987 a peça DONA DOIDA, baseada em seus poemas é encenada em todo Brasil pela atriz Fernanda Montenegro; O PELICANO,1987; A FACA NO PEITO, 1988; POESIA REUNIDA, em 1991; O HOMEM DA MÃO SECA (romance, 1994); MANUSCRITOS DE FELIPA (romance), em 1999; ORÁCULOS DE MAIO,(poemas).

sábado, maio 17, 2008

A IMPECÁVEL IMPERATRIZ LEOPOLDINA

Faço aqui um resumo dos dados e constatações, inferências se transcrições resultantes da copiosa leitura do livro “D. LEOPOLDINA – CARTAS DE UMA IMPERATRIZ”, de vários autores (Bettina Kann, Patrícia Souza Lima, Andréa Slemian, André Roberto de A. Machado, István Jancsó, Maria Rita Kehl, Guilherme João de Freitas Teixeira, Tereza Maria de Souza Castro e Angel Bojadsen) – Editora Estação Liberdade, 2006 – RJ. Inteiramente lido e anotado em fins de dezembro de 2006 e início de janeiro de 2007, leitura seguida de uma poética e proveitosa viagem à Áustria, onde passei, com a esposa e amigos, momentos inesquecíveis de contemplação da harmoniosa beleza das paisagens naturais e construídas, nos campos e nas cidades. Certas colinas chegam a dar a impressão de colagens ilustrativas de páginas bíblicas de preservadas sacralidades. As cidades antigas continuam sendo as mais novas do conhecimento humano, uma vez que não se contaminaram do impulso progressista que tanto deforma a feição estética para beneficiar o rendimento meramente financeiro. Ficamos horas e horas no Palácio Schonbrum, onde a nossa Leopoldina, filha do Imperador Francisco I, viveu antes de vir para o nosso país. Um cenário de deslumbramento por assim dizer intrínseco, uma vez que a naturalidade de tão antiga e sólida torna-se imperecível e, portanto, contemporânea. Uma antiguidade sempre moderna, por assim dizer. Tanto nos interiores requintados, brilhantes e encantatórios, como nos arredores ajardinados de tal maneira que a mão do homem se confunde com a própria mão de Deus – por assim dizer. Leopoldina era sobrinha de Maria Antonieta (mártir da Revolução francesa) e da Imperatriz Sissi (famosa pela série de filmes holliwoodianos), tinha 12 irmãs, uma das quais, a Maria Luiza, era casada com Napoleão Bonaparte. Seu nome completo é Maria Leopoldina Carolina Francisca Fernanda Beatriz, nascida em 23/01/1797. Sua filha Maria da Glória (1819-1855) casou-se com o tio Dom Miguel e foi sagrada Rainha de Portugal em 1828, com o nome de Maria II. Seu avô, Leopoldo II, foi Imperador da Alemanha e da Áustria, Rei da Hungria, Boêmia, Lombardia e Veneza. Uma biografia ilibada, a dela, pelo que se nota. Já o marido, Dom Pedro II (com o perdão da opinião) não primava pelas mesmas virtudes biográficas. O próprio pai de Leopoldina, sabedor da galinhagem sexual do genro, escreveu à Metternich que ele “é uma pessoa digna de pena”. O primeiro adultério aconteceu com a Domitilia de Castro (que era casada com Felício Pinto Coelho), a partir de 1822. Em 1825 ela foi nomeada Primeira Dama da Imperatriz, a quem confidenciara sofrer de morféia, “certamente com o intuito de afastar a imaginação da Imperatriz de ter seu esposo qualquer idéia de um contato mais íntimo com ela”, conforme está na página 518 do livro “CARTAS DE PEDRO I À MARQUEZA DE SANTOS – NOTAS DE ALBERTO RANGEL (Editora Nova Fronteira, RJ, 1984), que descreve as vicissitudes conjugais do infausto casal - algumas das quais citaremos nesta resenha. Outras amantes dele, o incontentável: a dançarina francesa Noemi (com quem teve uma filha, morta precocemente), Mariquinha Campos, Ana Rita (esposa de Plácido de Abreu), Ludovina (esposa do general Avilez), atriz Carmem Garcia, a esposa do naturalista Bompland, Maria Joana (filha de um capitão e casada com um general), Regina de Saturville (esposa do judeu Luciano), Carlota Ciríaco (filha de um rico industrial), Madame Saisset (costureira da Corte e esposa de Pedro Saisset, comerciante da Rua do Ouvidor – é de tradição oral que um filho dele (com ela) foi criado por amigos na Província de Minas, onde constituiu renomada prole com o sobrenome Pedro de Alcântara, em Pedra do Indaiá, conf. consta no livro “Família Oliveira Barreto”, página 161, deste resenhista), Joaninha Mosqueiro, Luizinha Mosqueiro, Andreza Santos, Gertrudes Meireles, Ana Sofia e Ambrosina Carneiro Leão. Na página 140 do citado livro de notas de Alberto Rangel, consta que “a voz pública espalhou que Dom Pedro tivera uma forte discussão com a esposa a propósito de dona Domitilia e que, chegando a maltratá-la fisicamente, dera causa à moléstia de que viera a falecer Dona Leopoldina. Fala-se até num pontapé que ele aplicou no ventre pejado da esposa”. Baixaria indigna de um imperador, não? Na página 167, do mesmo livro, menciona que Leopoldina era feia e desmazelada – mas o retrato dela estampado na capa do livro “D. Leopoldina – As Cartas de Uma Imperatriz”, contradiz essa falácia; ali ela aparece elegante e bonita, com uma leve expressão magoada no rosto, que não chega a sombrear a doce formosura dos traços de pessoa formosa, altiva e generosa, apesar de tantas vicissitudes sofridas. O pesar que me fica ao tomar conhecimento de tais desditas na leitura dos dois livros é constatar que o nosso país perdeu o lado afável e civilizado da influência austríaca para, desastradamente, adotar o lado intempestivo e malcriado de um imperador mais preocupado em namorar do que em governar. Se a nação brasileira tivesse admitido a boa influência dela em vez da má influência dele, a história de nosso país seria outra, muito melhor, mais honrosa e esclarecida. Mas, enfim (o que se pode fazer agora?), estamos aí na infindável enrascada de intermináveis desgovernos nacionais.

quinta-feira, maio 15, 2008

ASPECTOS PONDERÁVEIS DA HISTÓRIA DO BRASIL III

A transição da Monarquia para a República foi uma morrinha danada: nenhum heroísmo de nenhuma das partes. Do lado monárquico o Imperador alquebrado pelos anos, ao lado da filha Isabel maculada pelo marido antipático e desastrado, e do outro lado o neto Pedro Augusto, imaturo, beirando à monomania. Do lado republicano, sem brio moral e intelectual, Deodoro e Floriano, ex-súditos, incapazes de ombrearem as responsabilidades de um governo nacional renovador, acompanhados palidamente por intelectuais de muito verniz e de pouco conteúdo (Rui Barbosa, Quintino Bocaiúva, Benjamim Constant ). A ausência de personalidades fortes e capazes motivou a incapacidade de pelo menos manter-se uma boa aparência de governabilidade, deixando muito longe a ereção de uma República que alcançasse novos rumos de desenvolvimento, com o bom tino administrativo e a boa qualificação moral. Uma república, assim minúscula e capenga, tornar-se-ia, até os nossos dias, em disponível pasto para criar e engordar as ditaduras violentas em determinados períodos e as democracias corruptas em outros. A notória bazófia de sair do espeto e cair na brasa é o que faz de nossa história uma estória desluzida, repleta de jânios e lacerdas, ademares e malufes, barbalhos e sarneyes, geisels e lulas. No final do século XIX a distinção entre a nobreza e a burguesia enfatiza a classe dos excluídos sociais (os trabalhadores braçais) – e a publicação de “O Capital”, de Karl Marx, expõe o socialismo libertário que logo se confunde com o anarquismo. E aí as obras de Freud e de Nietsche começam “a semear dúvidas nas consciências desorientadas pelas conquistas científicas” que revelavam “o que estivera até então invisível: o cérebro era capaz de fabricar ódios, tensões, mal-estar”, segundo as palavras de Mary Del Priore, página 120, em seu esclarecedor livro “O Principe Maldito” (Editora Objetiva, RJ, 2006). Por volta de 1860 – escreve a mesma autora sobre o que acontecia em Viena, então um dos pilares da civilização européia: “como um sol poente, declinava suavemente o poder da aristocracia e emergia, cheia de saúde, uma burguesia culturalmente dominante”. No Brasil, os sucessores de D. Pedro II acumulavam problemas: Isabel praticamente desqualificada pelos defeitos do marido, que compensava a fragilidade conjugal com a truculência nos campos de batalha da desastrada guerra do Paraguai; Leopoldina (a outra filha, falecida prematuramente), cujo marido europeu só gostava de caçar. A previsão recaia sobre o neto Pedro Augusto (filho de Leopoldina), que vivia na Europa, onde brilhava nas altas rodas aristocráticas e culturais. Transido entre os pretendentes. D. Pedro II descuidou e a Princesa Isabel promulgou “uma lei discutida e votada de afogadilho”, extinguindo a escravidão (que nem deveria ter existido, é claro), “sem um tostão de indenização aos senhores (proprietários dos escravos) espoliados”. O desajustado 13 de Maio decretou a falência da Monarquia e instaurou o desarranjo institucional, que vigora até os dias atuais. Isso porque de uma hora para outra não havia mais quem trabalhasse: “os agricultores do Vale do Paraíba não tinham meios para colher as safras, e os homens livres se recusavam a trabalhar no regime antigo. Das 773 fazendas entre Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, 726 estavam hipotecadas. Na Bahia, os canaviais queimavam, sem deixar de pé nem a cercas. (...) O café se valorizava nos outros mercados...” (ainda conforme a obra citada). O Brasil conheceu, a partir de então, o horror do êxodo rural e a instauração das favelas em todas as cidades, causando outro tipo de marginalidade, que não só esvaziou o fluxo monetário da riqueza material, como criou o quisto social que mantém esse mórbido e terrível estado de guerra interna que afeta todos os quadrantes da nacionalidade. Estava, assim, decretada, palidamente, e sem uma programação consistente, mais uma republiqueta latino-americana, em conseqüência da desilusão de Pedro Augusto (que agravou incuravelmente sua tendência depressiva); da humilhação de Dom Pedro II e de toda a Corte, sob os gritos quase inaudíveis de “viva a república”, inaugurando o duradouro caos da calmaria e da ociosidade no embalo do “bailar e fazer bailar”, ou seja, no deixar que tudo fique no mesmo estacionamento. Além da desilusão dos monarcas vieram os estigmas de culpas sobre o Conde D”Eu e a Princesa Isabel, o confinamento definitivo do Príncipe, os escândalos do congresso, o diabetes de ex-imperador e a primeira ditadura republicana. Deodoro tinha apresentado “um projeto de emissão de mais papel-moeda – e os sebastianistas e os radicais vetaram.O Presidente não teve dúvida. Dissolveu o congresso e assumiu a ditadura. A desculpa era salvar a República e o País... de uma restauração da Monarquia” (página 275 do livro supra citado).

quarta-feira, maio 14, 2008

A FAMÍLIA OLIVEIRA BARRETO

Genealogia, Notas e Comentários – Edit, Express Artes Gráficas, Divinópolis, 2005.  
Fragmentos: Página 125: “A maior dificuldade da pesquisa genealógica reside na chamada descendência matrilinear, uma vez que o parentesco através da mãe foi, até recentemente, menosprezado socialmente. A maioria dos nomes de mulheres que pesquisamos surge nos registros sem a menção do sobrenome de família. Um amigo dizia uma vez, rindo, quando eu lhe contava a dificuldade de saber a descendência pelo lado feminino: “Toda mulher é parente de tatu”. E, na minha dúvida, ele emendou: “Todas tem o Jesus no sobrenome. É igual tatu no buraco, acertado pela fisga do caçador: ele emite um som parecido com o grito um pouco rouco e assustado da palavra JESUS”. Parece brincadeira, mas é a pura verdade. Uma multidão de Fulana Maria de Jesus, Sicrana Maria de Jesus, Beltrana Maria de Jesus. (...) O leitor pode imaginar a dificuldade diante de uma relação de descendência de uma família de trezes filhos, entre os quais pelo menos cinco são mulheres. Se soubermos com quem se casaram, ainda bem, temos uma pista. Mas se não sabemos, como saber então os nomes dos filhos se eles vão assinar os sobrenomes dos pais e não o sobrenome por assim dizer fantasioso da mãe?” Cremos tratar-se não só de um erro histórico, mas de uma injustiça histórica, uma vez que todo ser humano é, por assim dizer, mais filho da mãe (que o guarda e alimenta em seu ventre e depois o guarda e alimenta em seus braços e seios) do que do pai que, por assim dizer, teve pouco trabalho nesta misteriosas e magnífica criatividade. Na página 130 do livro supra-citado tentamos homenagear algumas figuras femininas mencionadas, de passagem, no contexto da dificultosa pesquisa. As Primas da Juventude: O nome é a forma, o ser é o conteúdo. Às vezes um fica aquém do outro (Marta, Eloína, Odília, Heloisa, Irene), Às vezes um suplanta o outro (Maria, Eponina, Gislaine, Olga). Às vezes chegam juntos à mesa do jantar, quando a poesia e a musa equilibram-se nas trilhas e ladeiras e pinguelas da roça, nos morros e baixadas da região dos Lavapés, nas grimpas e vazantes da Cachoeirinha do Bom Sucesso, nas praias e quebra-corpos da Lavrinha. O leitor pode ficar cético quando eu citar as Franciscas, as Josefas, as Arcângelas e Escolásticas: pois devia vê-las ao vivo da força, no garbo da sublimação, no tempo das charruas e doçainas, no ciclo das obnubilações, diante ou debaixo do pé de bilosca e da parreira de uvas, no respaldo da caçoada dos outros longe dali, nas noites de lua cheia do Arraial, nos dias amoitados do azul da alma. Cada uma tem sua tecla, sua fala, sua escrita, seu murmúrio silente ou musical e caricioso (o amor-em-pencas, os lemas idílicos)... Sei não, mas nunca soube aliterar os estribilhos preliminares, nem mesmo colher e guardar os cheiros afrodisíacos das axilas e virilhas, para não falar nas outras flores existenciais. O leitor precisava conhecer a secular pré-existência das flores-musas chamadas Estefânia, Percília, Virgínia, Anna, Rosalina, Cândida, Mirafélia e Clarundina. o leitor precisava conhecer e nelas se reconhecer no vai-e-vem da gangorra no galho do cajueiro: na ida, o horizonte do mundo; na volta, o horizonte da casa: a parte feminina de Deus e de tudo que existe, a parte feminina do homem e de tudo que ama. E por falar em Deus, por que não falar em Deusa? Ah o melhor da vida de cada ser masculino é saber carregar o olhar do amor feminino em seu próprio olhar! ............................................... Pág.278: “A Genealogia é um ponto importante na História Humana, tanto que o Novo Testamento das Escrituras Sagradas estampa logo nas suas primeiras páginas a relação da descendência davídica de Jesus. E mesmo muito depois, na chamada Idade Média, um dos objetivos das Cruzadas era não só expulsar os sarracenos de Jerusalém, como restaurar seu Templo e recolocar em seu trono um descendente de David – e assim cumprir a promessa de paz profetizada no Velho Testamento das mesmas Escrituras.”

MEU TRISAVÔ PATERNO

Bernardo José de Oliveira Barreto - 1797-1881. “Diocese de São João Del Rei Cúria Diocesana Arquivo Eclesiástico Certidão Certifico que, às folhas quinhentos e cinqüenta e quatro (554), verso, do Livro de Registros de Batismo no. 9 (nove), (1791 a 1799), tomo II da Paróquia de Santo Antônio, da cidade de Tiradentes, desta Diocese de São João Del Rei, encontra-se o seguinte registro: “ BERNARDO – ine.- Matriz va. a 21 de 8.bro. de 97 – Aos dezasseis dias do mez de Oitubro do anno de mil e Settecentos e noventa e Sette na Matriz de Santo Antônio da Villa de São José da Comarca do Rio das Mortes, e Bispado de Marianna das quatro para as cinco horas da tarde baptizei e puz os Santos Óleos a BERNARDO nascido aos vinte e Sette dias do mez de agosto do dito anno filho legitimo de Antonio Joze de Oliveira Barreto e de sua mulher Donna Anna Joaquina Cândida de Castro natural desta Freguesia da Villa de São Jose neto pela parte paterna de Gregório Francisco de Oliveira, e de Maria Rozaria de Freitas, naturais da Freguesia de Santa Cristina de Aroens Termo da Villa de Guimaraens Arcebispado de Braga, e pela parte materna do Capitão Faustino Joze de Castro natural da Freguezia da Sé da Cidade do Porto, e de Donna Rosa Angélica (*) natural da Freguezia de Nossa Senhora da Conceição da Freguezia de Prados desta Comarca do Rio das Mortes: foi padrinho o ilustríssimo e exCellentíssimo Senhor Bernardo Joze de Lorena Governador, e Capitão General da Capitania de Minas Gerais por Procuração sua com o Sello de Suas Armas que pessoalmente appresentou o Doutor Joze Antonio Appolinario da Silveira Ouvidor Geral da Comarca do Rio das Mortes da qual o theor he o Seguinte = Bernardo Joze de Lorena do Conselho de Sua Magestade Fidelíssima Governador, o Capitão General da Capitania da Minas Gerais. Pela prezente faço meu bastante Procurador ao Senhor Doutor Joze Antonio Appolinario da Silveira Ouvidor Geral da Comarca do Rio das Mortes para que em meu nome possa assistir como padrinho ao Baptismo de hum menino filho de Antonio Joze de Oliveira Barreto, e de sua mulher Donna Anna Joaquina Cândida de Castro e elevar ex Sacro fonte o dito batizando. Villa Rica doze de Settembro de mil e sette centos e noventa e Sette = Bernardo Joze de Lorena = E foi madrinha donna Hyppolita Jacintha Teixeira (**) moradora na Freguesia dos Prados de que para o tempo Constar fiz este assento, e por verdade o assignei. O Coadjutor João Miz. Lopes”.//////////////////Nada mais continha do dito registro, que fielmente foi copiado do original a que me reposto. Ita in fide Parochi. São João Del Rei, 13 de Fevereiro de 2004. Assinado por Monsenhor Sebastião Raimundo Paiva Pároco da Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar e Coordenador Geral do Arquivo Eclesiástico.” A partir de 1818 o nome de Bernardo começa a constar nos registros paroquiais e cartoriais do Desterro do Tamanduá, primeiramente ligado ao nome de seu pai, o advogado, alferes de ordenanças e solicitador de causas Antônio José de Oliveira Barreto, que emprega a herança recebida por falecimento da esposa Anna Joaquina para adquirir as Fazendas Bom Jardim, em Cláudio, para a filha Francisca Constância (ou Lucinda) de Oliveira Barreto casada com Vicente Ferreira do Amaral; e a fazenda da Laje, no Desterro , para ao filho Bernardo, que se casou em 1825 com Josepha Maria de Jesus, filha de Manuel de Souza Pinto e de Anna Joaquina de Souza, fazendeiros na Região dos Souzas, distrito de Cláudio. O Arraial de Nossa Senhora do Desterro já era, na época, antigo e notório recebedor dos retirantes da Comarca do Rio das Velhas, entre os quais o Manuel Carvalho da Silva, cujo nome consta entre os que assinaram o Termo de Criação da Villa de Sabará (a terceira de Minas). Posseando-se de uma bela, grande e rica Sesmaria, ele construiu a Igreja de Nossa Senhora do Desterro (beatificada em 1754 e de pé até hoje graças às suas sólidas pilastras e paredes de pedras) e constituiu seu Patrimônio com a doação de 140 alqueires de terra. Os livros do século 18 constantes nos cartórios e paróquias do lugar que agora tem o nome de Marilândia (Município de Itapecerica) estão repletos de nomes de pessoas oriundas de Sabará, Congonhas e de Curral Del Rei. Isso porque o ouro minguava na região do Rio das Velhas e os mineradores procuravam outros destinos e outras atividades. Além de terras férteis e bem banhadas, o ouro era farto nas minas próximas do Tamanduá e brotava nos leitos dos Rios Boa Vista e Itapecerica, no Córrego Areado, nas regiões da Lavrinha e da Serra Negra e também no lugar chamado Bom Sucesso do Sabarazinho, sede da Fazenda da Laje, do Bernardo. Em 1873 ao escrever seu Testamento, ele declara que teve em estado de solteiro a filha Mecia, com Maria, do Lavapés (arrebalde do Desterro), que naquele momento estava casada com Manuel Fernandes da Cruz, e residia no Arraial Novo de Santa Rita do Aterrado, hoje Santa Rita de Cássia, sul de Minas. Declara também que em estado de viúvo teve a filha Maria Honória, com Eva, parda, que era filha de Raquel, criola, todas moradoras em sua casa, acrescentando do próprio punho que reconhecia, para efeitos legais, as duas, Mecia e Maria Honória, como suas herdeiras legítimas. Os outros filhos que deixa e que constam do Testamento são, pela ordem de nascimentos: Francisca de Oliveira Barreto, casada com Pedro Amaro Teixeira e depois com Joaquim Bernardes Teixeira; Antônio José de Oliveira Barreto (meu bisavô) casado com Maria Arcângela Tavares e depois com a sobrinha (através de autorização clerical do próprio Vaticano) Galdina Cândida Barreto Tavares; Bernardo José de Oliveira Barreto cc Maria Florea de Jesus; Maria Bernarda de Oliveira Barreto cc Manoel Lino da Santíssima Trindade; João José de Oliveira Barreto cc Firmina Cândida de Moraes e Lara e depois com Ana Cândida Tavares; José Bernardo de Oliveira Barreto, celibatário; Pedro José de Oliveira Barreto cc Escolástica Lucinda do Espírito Santo e depois com Maria Antônia de Jesus; Joaquim José de Oliveira Barreto cc Maria do Carmo Fraga; Rosalina Cândida de Oliveira Barreto cc José Antônio Tavares Sobrinho e depois com João Gabriel do Amaral; Mariano José de Oliveira Barreto cc Maria Tavares Barreto e depois com Rita Cândida Tavares; Manoel José de Oliveira Barreto cc Belarmina Maria de Jesus; e a citada Maria Honória Barreto (tinha apenas 3 anos de idade em 1873) cc Antônio de Souza Leite. Além da irmã Francisca, do casamento do pai com Anna Joaquina Cândida de Castro, Bernardo teve mais seis irmãos do segundo casamento paterno, com Felizarda Maria de Jesus, a saber: Joaquim José de Oliveira Barreto, celibatário; João José de Oliveira Barreto cc Vicência Joaquina do Amaral, depois com Maria Teodora de Oliveira (bisavós do empresário, advogado e escritor Ruy Barreto), depois com Maria Cândida de Jesus e depois com Cândida Bellarmina de Jesus Coelho; Anna Felizarda de Oliveira Barreto cc Domingos José da Silva Fayal (da família de Tiradentes); Rita Umbelina de Oliveira Barreto cc Carlos José de Resende; Alexandre José de Oliveira Barreto cc Marianna Lúcia Vianna e depois com Anna Custódia de Jesus; Francelina Cândida de Oliveira Barreto, que permaneceu solteira. No Mapa Populacional do Desterro, de 1839 cx. 14, doc. 44, do Arquivo Público Mineiro, BH, MG), o Bernardo consta como Negociante e Fazendeiro, possuidor de 16 escravos. Desde 1833 era Juiz de Paz: numa das eleições obteve 116 votos dos 118 eleitores do Distrito. Foi também Jurado, Subdelegado, Ajudante de Ordenanças, Capitão e Comandante da Guarda Nacional do Desterro e depois Major e Comandante da Guarda Nacional de São Bento do Tamanduá, hoje Itapecerica. No Testamento ele pede Missa de Corpo Presente e mais 80 Missas de esmola do costume, mais 10 por alma de Josepha, sua esposa falecida, mais 10 por alma de seus pais, mais 8 por alma de cada um de seus filhos falecidos: |Maria, Bernardo, Francisca e José. Deixa boas quantias em dinheiro para as Igrejas do Rosário e de Nossa Senhora do Desterro (ambas do Distrito do Desterro) e também para os escravos alforriados e para muitos afilhados. A relação dos bens móveis e de raiz e de semoventes ocupa 62 páginas do Códice. Entre os quais destacamos: seis casas no Desterro, as Fazendas da Fontinha, da Lage, da Cachoeira do Junco, do Itapecerica ou Cachoeirinha e da Lavrinha, além de móveis, prata, ouro, 303 arrobas de café e 3.145$195 em moeda corrente. Em 1841 obteve a Carta Patente de Capitão da 3ª. Cia. do lo. Batalhão da Legião da Guarda Nacional do Município do Tamanduá, sediado no Desterro, cargo que já ocupava desde 1832 e que perdeu em dezembro de 1842, mesmo obtendo 110 votos dos 126 votos apurados na eleição junto aos membros da tropa. Perdeu o cargo porque tinha sido suspenso das funções em 22 de julho do mesmo ano, por ter comandado o Batalhão a favor dos insurgentes na chamada Revolução Liberal de 1842 que visava, não derrubar o governo imperial, mas sim o Ministério que dissolveu as Assembléias, amordaçou a oposição e centralizou o poder executivo, limitando, em conseqüência, o Poder Político dos Municípios. No Processo de Autuação (Lote 20260, de 1842, do Arquivo Judiciário de Itapecerica), de 23 páginas manuscritas, constam os depoimentos de quatro testemunhas, todos enaltecendo as qualidades morais e militares do acusado (que chegou a ser preso e a ter os bens sequestrados), de tal maneira que não restou ao Promotor e ao Juiz senão o trabalho de absolvê-lo. Passado algum tempo (outubro de 1845) um Ofício do Chefe Interino da Legião é remetido ao Presidente da Província Quintiliano José da Silva, nestes termos: “Como se mudasse deste Município para a cidade de São João Del Rei, o Major do Primeiro Batalhão da Primeira Região da Guarda Nacional deste Município o cidadão Manuel Pereira de Andrade, vendendo o estabelecimento comercial que aqui tinha, e estando por conseguinte vago este posto, que cumpre preencher-se, tenho a honra de apresentar a V. Exma. o cidadão Bernardo José de Oliveira Barreto, pessoa hábil e abastada, cuja adesão ao atual governo é assás reconhecida e me parece digno de ocupar o dito posto, se merecer a aprovação de V. Excia.”. Nesta época o contingente da Guarda Nacional do Desterro (instalado no Largo da Igreja Matriz) constava de : um capitão, um tenente e um alferes, um primeiro-sargento, dois segundo-sargento, um furriel, oito cabos, cento e dois guardas de serviço ordinário e vinte e cinco na reserva. A Legião do Tamanduá (novo posto do Bernardo) era muito maior: totalizava um mil quatrocentos sessenta e cinco elementos e abrangia, além da Villa, os Distritos do Desterro, de São Francisco de Paula, de Santo Antônio do Monte, do Pântano, do Diamante, do Andaiá, de Campo Belo e de Candeias. (*) Seu nome completo é Rosa Angélica da Luz, descendente de ilustres membros da nobiliarquia paulistana. Sua biografia é bem romanesca: de seu casamento com Faustino José de Castro foi mãe, além da Anna Joaquina, de Joaquim José Carlos Fulgêncio de Castro casado com Anna Antônia Querubina de Jesus e depois com Anna Tereza de Jesus Villas-Boas, legando à posteridade descendência ramificada nas famílias de nobres e potentados do Império ) os Andrada, os Fontoura, os Caldeira Brant, os Leite Ribeiro. Depois, em estado de viúva, viveu um caloroso romance com o Capitão-Mor Pedro Teixeira de Carvalho, tendo com ele o filho Pedro Teixeira de Carvalho, o Moço, expoente, na época, da administração pública da Villa de Barbacena, merecendo a homenagem póstuma de ter hoje o nome da principal Praça da cidade. (**) A Hyppolita era filha legítima de Pedro Teixeira de Carvalho e de Clara Maria de Melo, proprietários da célebre Fazenda da Ponta do Morro, em Prados. era casada com o Inconfidente Francisco Antônio de Oliveira Lopes – e é considerada pelo historiador Dario Cardoso do Valle como a única presença feminina consciente e positiva da Inconfidência Mineira, não só inspirando como instruindo o marido e os companheiros da Conjuração. 

Dados extraídos de meu livro “A Família Oliveira Barreto – Genealogia, Notas e Comentários “–Editora Express, Divinópolis, MG, 2005.

segunda-feira, maio 12, 2008

PASMACEIRA

Se ainda estamos neste baixo astral de terra magoada, amassando o barro de todo dia enfadonho, expiando culpas no cartório e pecados na sacristia: é porque não somos flores que se cheire, não é mesmo? Somos o ranzinza caído e pisoteado: o torpe vencedor ou reles vencido? O vento que sacode as árvores do quintal, pode ser o sopro de nossos obsessores da baixa atmosfera, que azucrinam nossas idéias, aguçam os nossos males que disparam infartos e derrames contra a nossa debilidade. O dia é longo neste envoltório de gazes densos, que atravessam o rio das fezes e das urinas... Por que a morte definitiva não vem de uma vez? Em seu lugar vem o tempo retrógrado, a eternidade em pedaços esfarrapados.

sábado, maio 10, 2008

A CEGUEIRA CREPUSCULAR

Paul Verlaine era doido varrido atento e confesso que se pendurava nas palavras para escalar as ribanceiras do abismo de vez em quando despenhava no lado mais escorregadio para depois, esforçado, subir de novo Aos trancos e barrancos subia outra vez agarrado às palavras de fundas raízes. As imagens que pingam da insônia são as mesmas que instauram e abastecem a insônia são obsessivas depressivas corrosivas instintuais acordam as fibras e os fluxos da lassidão amargam a boca na azia adoecem a urina na vesícula chocam nas paredes do cérebro escancaram as portas do coração expõe a fratura óssea e a infecção visceral abortam os embriões da criatividade remexem o vasilhame das pulsões indormidas acicatam os laivos insones dos resíduos e dos prenúncios antecipam as vergônteas do caos nas primícias imobilizam as pernas no catre. Enquanto o resto do corpo sofre a refrega da chuva do inconsciente na madrugada.

segunda-feira, maio 05, 2008

ASPECTOS PONDERÁVEIS DA HISTÓRIA DO BRASIL (II)

1 – Do que às vezes resulta a chamada infalibilidade papal: em meados do século XV o Infante D. Henrique “enviou um embaixador a Roma para obter uma bula papal que lhe concedesse não apenas o monopólio no comércio com a África como a autorização para “fazer a guerra contra os infiéis, tirar-lhes as terras e escravizá-los. O papa Eugênio IV assinou tal bula em 19/12/1442 e Nicolau V renovou-a em junho de 1452. Assim é que estava nascendo um império escravagista”. Página 74 do livro “A Viagem do Descobrimento”, de Eduardo Bueno (Edit. Objetiva, 1998). A ingratidão dos brancos: além de escravizarem os negros, os portugueses não só cometeram outras barbaridades e ingratidões étnicas e éticas: depois de se valerem dos tupiniquins (tupis e guaranis) que ocupavam quase todo o litoral brasileiro, para vencerem os tupinambás-tamoios, aliados dos franceses, eles massacraram os indígenas de tal maneira que “por volta de 1570” as referidas tribos “já estavam virtualmente extintas. Muitos de seus membros por ordem de Mem de Sá (por que esse assassino merece ter uma rua com seu nome em Divinópolis?), “o terceiro Governador Geral do Brasil”. (ver página 92 da obra supra-citda). O Amazonas (quem te viu e quem te vê) nos anos de 1500: “Aquele mar doce coagulado de ilhas – algumas enormes: todas felizes pela fertilidade do solo – a maioria habitada por gente mansa e sociável, - mas pouco úteis para os nossos colonizadores, porque ”não possuem produtos desejáveis, a saber: ouro e pedrarias”. “Havia árvores tão grandes que um cordão de 16 homens unidos pelas mãos não era capaz de abraçá-las”. Os animais eram todos desconhecidos e pareciam monstruosos. (Pág. 190, do livro “Náufragos, Traficantes e Degredados”, de Eduardo Bueno (Edit. Objetiva, 1998). A extinção do Pau Brasil: “a exploração do “pau-de-tinta” foi feita num ritmo tão feroz que, ao longo do séc. XVI, portugueses e franceses levaram, em média, oito mil toneladas de madeira por ano para a Europa. Só no primeiro século de exploração, cerca de dois milhões de árvores foram derrubadas – uma espantosa média de 20 mil por ano, ou quase 50 por dia. Não é de se estranhar, portanto, que, já em 1558, as melhores árvores não pudessem ser encontradas a menos de 20 km. da costa”. Página 75 da obra citada. Vale a pergunta: e daqui a quanto tempo poder-se-á dizer o mesmo das atuais florestas (de toda espécie de madeira) remanescentes no país? Entradas e Bandeiras: “Os bandeirantes paulistas foram o s maiores caçadores de escravos de seu tempo e os levaria a destruir os Trinta Povos Guaranis (como eram chamadas as “missões” fundadas pelos jesuítas espanhóis). As Entradas eram apenas incursões exploratórias e ocorreram muito antes (as de Vespúcio e de Martim Afonso nos primeiros anos de 1500, quando o país era uma das “colônias para a qual os condenados de Portugal eram enviados para cumprir degredo). Um alvará de El-Rei em 1535 determina que as colônias e sobretudo o Brasil sejam declaradas “coutos e homizio para todos os condenados que nelas quiserem ir morar, ainda que sejam condenados por sentenças até de pena de morte, excetuando somente os culpados por crime de heresia, traição e sodomia e moeda falsa. Por outros quaisquer crimes, não serão os degredados para o Brasil de modo algum inquietados ou interpelados”. Página 91 do livro “Capitães do Brasil”, de Eduardo Bueno, Edit. Objetiva, 1999. Um outro mau exemplo brasileiro? Na página 137, da obra citada, lemos que “apesar de Luís de Góis ter levado a planta para Portugal, o hábito de fumar tabaco só se espalhou na Europa depois que o embaixador francês em Lisboa, Jean Nicot, recolheu secretamente algumas mudas no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, e as enviou, em 1560, para a rainha Catarina de Médicis, mulher do Rei Henrique II. A rainha e a corte francesa adotaram o hábito de fumar. Ironicamente, embora Jean Nicot nunca tenha fumado – nem recomendasse o uso da erva – seu nome acabaria sendo usado para batizar o princípio ativo do tabaco: a nicotina”. Assim Francisco Pereira escreve ao rei de Portugal, em 1536, sobre a sua dotação hereditária de terras na Bahia: “Esta é a melhor e a mais limpa terra do mundo... Uma anta vale um vintém, um veado o mesmo um vintém, um porco montês o mesmo vintém, um coelho dois vinténs, e muitas caças de outras maneiras, o peixe é tanto que vai de graça e são peixes de oito palmos, muitos linguados, salmoneres, pescadas e sardinhas... A costa lhe dará tudo o que lhe deitarem, os algodões são os mais excelentes do mundo e o açúcar se dará quanto quiserem” (Página 260 do livro “Capitães do Brasil”, do autor citado). Na página 130 da mesma obra, há a referência às mansões construídas por Martin Afonso, “destruídas pelo terremoto que devastou Lisboa em primeiro de novembro de 1755, matando cerca de 20 mil pessoas. A cidade foi reconstruída pelo Marquês de Pombal, graças aos diamantes encontrados pouco antes no Arraial do Tejuco, hoje Diamantina, em Minas Gerais”. Obra citada, página 130.

quinta-feira, maio 01, 2008

ASPECTOS PONDERÁVEIS DA HISTÓRIA DO BRASIL

Às vezes a gente pensa porque o nosso país é assim desarticulado e praticamente ingovernável. Um território continental belíssimo, provido de todos os bens de uma natureza exuberante e generosa, certamente não merecia e não merece um tratamento civilizatório tão imaturo e tacanho, tão deslavado e truculento, tão ineficaz e destruidor. É a tal assertiva: o que começa mal, acaba mal. Sabemos que o Brasil ainda não acabou. Mas, pelo andar da carruagem, parece que nada afastará o abismo de uma extremidade que aos poucos se aproxima. Ou estou sendo excessivamente pessimista, ao atentar e a crer no que diz o noticiário dos acontecimentos sociais de nosso dia-a-dia? “Gigante pela própria natureza”, diz o verso do hino nacional. Sim, o problema talvez esteja aí: no gigantismo territorial. Se o país fosse menor, vamos dizer: repartido em vinte e tantos países – isso ajudaria na administração de cada um e de todos? Talvez, mas, e a grandeza da pátria amada? E o sonho da unidade brasileira em bons termos? Se o problema é o gigantismo, então a solução está no surgimento de governantes à altura, e não esses que têm surgido ao longo dos séculos. Vemos pelos anais oficiais que eles, os governantes ao longo da história, só apresentam resultados negativos, o que prova à exaustão uma incompetência crônica, repetitiva. Assim raciocinando estarei acertando ou errando? São perguntas (todas acima) que merecem uma pausa para meditação, não? Abaixo transcrevo, reverenciando o senso de humor do poeta Sebastião Nunes, alguns dados de sua hilariante “História do Brasil” (edição DUBOLSO/MAZZA, Sabará, MG, 1992). 

1 – As Capitanias Hereditárias. Caio Prado Júnior explica, em “História Econômica do Brasil (Edit. Brasiliense, 1970), que o governo português, ainda no séc. XVI, para não perder a posse do território brasileiro para os invasores franceses, teve que criar as chamadas Capitanias Hereditárias, valendo-se do espírito de aventura de seus súditos “que se dispusessem a arriscar cabedais e esforços na empresa”. Entre os pretendentes (doze) não figura nenhum nome de grande nobreza ou do alto comércio do Reino. A maior parte deles fracassou na empreitada, perdendo “nela todas as suas posses (alguns até a vida), sem ter conseguido estabelecer no Brasil nenhum núcleo fixo de povoamento”. 

2 – Antropofagia. Hans Staden, em “Duas Viagens ao Brasil” (Edit.Itatiaia, 1974), descreve cruamente a prática antropofágica no país, em certas tribos indígenas: “o prisioneiro é golpeado na nuca,... de modo que lhe saltem os miolos” e, levado ao fogo, “raspam-lhe toda a pele...tapando-lhe o ânus com um pau”. Depois de esfolado, tem as pernas e os braços cortados, separando-se as costas com as nádegas. “As vísceras são dadas às mulheres...que fervem-nas e com o caldo fazem uma papa rala, que se chama mingau, que elas e as crianças sorvem”, juntamente com “a carne da cabeça, o miolo do crânio, a língua e tudo o que podem aproveitar”. 

3 - Os Escravos. Eis como o assunto é tratado por Gilberto Freyre em “Casa Grande & Senzala (edit. José Olímpio, 1975): “Ao escravo negro se obrigou aos trabalhos mais imundos na higiene doméstica e pública dos tempos coloniais. Um deles, o de carregar à cabeça, das casas para as praias, os barris de excremento... que ficavam longos dias debaixo da escada....Quando o negro os levava é que já não comportavam mais nada. Iam estourando de cheios e de podres. Às vezes largavam o fundo, emporcalhando-se então o carregador da cabeça aos pés....É de se presumir que o escravo africano, principalmente o de origem maometana, muitas vezes experimentasse verdadeira repugnância pelos hábitos menos asseados dos senhores brancos”. 

4 - Os Índios. Trecho (em linguagem graficamente atualizada) de Pêro de Magalhães Gândavo, em “Tratado da Província do Brasil” (edit. do Instituto Nacional do Livro, 1965): “Não se pode numerar nem compreender a multidão do bárbaro gentio que semeou a natureza por toda a terra do Brasil, porque ninguém pode pelo sertão adentrar seguramente, nem passar por onde se acha povoações de índios armados contra todas as nações humanas – e assim como são muitos, permitiu Deus que fossem contrários uns aos outros, e que houvessem entre eles grandes ódios e discórdias, porque se assim não fosse, os portugueses não poderiam viver na terra nem seria possível conquistar o tamanho poder de tal gente”.