terça-feira, abril 12, 2011

SINAIS DO TEMPO

Tentei e não consegui escrever um texto sobre o sanguinário massacre do Realengo, no Rio. Cheguei a começar com as palavras: “as crianças são as pessoas mais importantes do mundo, as mais graciosas e sinceras, as mais delicadas, as mais vulneráveis. Ninguém tem o direito de maltratá-las nem os próprios pais e mães”. Todas as palavras seguintes foram interrompidas por lágrimas ardentes, amargas, sufocantes. O assunto estava acima de minha capacidade de domar o coração, que não suportava tanta dor, tanta tristeza. A infelicidade dos personagens, incluindo a do próprio autor do massacre travava minhas mãos nas folhas de papel e no teclado do computador. Estamos vivendo num tempo e num mundo possuídos de inexorável perdição? Não consigo suportar tal barbaridade, não disponho de serenidade momentânea para escrever sobre o assunto. Lamento. - O beato e o ateu situam-se em posições opostas e no mesmo ramo de atribuições. O ateu respira mais livremente, é mais dono de si mesmo, e às vezes até extrapola da convicção, tornando-se arrogante em vez de consciencioso. O beato também extrapola, julgando ser dono de uma verdade improvável, da qual apenas ouvir falar, passando adiante uma veracidade flexível. Quando acontece algo de bom, ele diz que Deus é bom pai; se é algo ruim, diz que Deus sabe o que faz. Uma argumentação muito cômoda, não? Tal crendice assim gratuita é um tanto blasfema, não? Pois justificando a (im)provável ação de Deus, o beato ao falar em nome de Deus assume os atos Dele (como se fossem de sua própria e humana autoria). Nesse ponto o papel do agnóstico é mais razoável: não precisa assumir o peso de acreditar naquilo que não entende. O escritor Robert M. Pirsig é muito claro ao afirmar que “quando uma pessoa sofre de um delírio, isso se chama insanidade. Quando muitas pessoas sofrem de um delírio, isso se chama religião”. - “Estamos vivendo no tempo das invasões bárbaras” – assim Ítalo Calvino, romancista italiano, escreveu em 1962. “Os bárbaros desta vez” (ele acrescenta) não são pessoas: são coisas. São os objetos que acreditamos possuir - e que nos possuem”. Penso que hoje, muitos anos depois, os bárbaros pessoais invadem novamente os redutos civilizados com toda a gana e garra de uma incontida alienação mental, que afetam e dominam a parte mais jovem da humanidade, que não sabe ou não quer manter-se socialmente, a não ser assimilando práticas irracionais de despersonalização, bagunçando o ambiente de suas vivências com os usos e abusos de um rol de vícios virtuais e alienantes. O resultado da parafernália é que as pessoas comuns estão ficando com medo até de andar nas ruas – e as crianças correm riscos até dentro das até então inatacáveis escolas infantis. Os hunos e os godos estão em toda parte, com suas estranhas ameaças. - Creio que a alternativa de quem não possui outro amparo, outra possibilidade de escolher a própria trajetória salutar no emaranhado dos caminhos, é entrar no clima das belas artes e dos exercícios esportivos. Que o leitor tente, como eu, entrar no clima da boa música (clássica e mesmo popular), na literatura dos grandes mestres, na imensidão visual da natureza ainda não degradada e nas obras dos consagrados pintores e escultores (mesmo em Divinópolis temos a pintura do Heraldo Alvim e do Waldir Caetano e a escultura do GTO e do Jadir João Egidio, a poesia de Adélia Prado e de Osvaldo André de Mello. Ou então, e também, entrar na vivacidade do campo e da floresta nas regiões rurais, subir e descer os caminhos e campinas, adentrar mentalmente nos infindáveis arcanos de uma noite escura ou enluarada.... - Sou radical nas palavras e nas teorias, mas condescendente nas ações cotidianas. Prejulgo o castigo, concedendo o perdão. Assim eu diria, se dissesse. Ser velho é triste? É. Mas o que se há de fazer? Se não fosse velho, já estaria morto. Viver é perder os parentes e amigos e a própria pessoa, ao longo do tempo, que também se perde, para quem um dia morre. A sensualidade é uma árvore de muitos galhos. Dois deles chamam mais atenção: o redentor e o promissor.

quarta-feira, abril 06, 2011

BIBLIOGRAFIA PROVISÓRIA DE LÁZARO

 1 – Obras (livros) publicadas: Contos: – A Cabeça de Ouro do Profeta – imprensa oficial de BH., 1970. - Aço Frio de Um Punhal – Editora Guanabara RJ. 1986. Poesia: - Árvore no Telhado – Ed. Movimento AGORA- Divinópolis – MG. 1969. - Mel e Veneno – Ed. Express – Divinópolis, 1984. - A Lapinha de Jesus de parceria com Adélia Prado –Editora. VOZES, Petrópolis,RJ., 1969. Ensaios: - Memorial de Divinópolis – Prefeitura de Divinópolis, MG.,Ed. Serfor, 1995. - História de Arcos – Prefeitura de Arcos, MG., 1992. - Memorial do Desterro – Ed. Serfor, Divinópolis 1995. - A Família Barreto (pesquisa genealógica) – Ed. Express, Divinópolis, MG 2005. Participação em Antologias: - A Poesia Mineira do Século xx., de Assis Brasil, Imago, RJ, 1998. - Nove Opowiadania Brazyligskie (Polônia). Trad. de Janina Z,Klave, 1982. - Riqueza Cultural Ibero-Americana, de Pedro Pires Bessa, FAPEMIG, Divinópolis, 1996. - Flor de Vidro (contos de autores mineiros). Ed. Arte Quintal, BH, 1991. - Veredas de ROSA., de Lélia Parreira Duarte, PUC Minas, BH, 2000. - Revista FICÇÃO – São Paulo, 1977. - Jornal AGORA – Textos e Ressonâncias., de Pedro Pires Bessa, Ed. FUNEDI, 2003. - Palavra Puxa Palavra , de José Afrânio Moreira Duarte, Ed. do Escritor, SP, 1983. Teatro: - O Clarão, em parceria com Adélia Prado (representado). - Quem Matou o Filho da Onça (peça infantil, representada). - Bar – Doce Lar – representada em parte em Divinópolis. - O Reinado (inédita). - Aqui Neste Desterro – inédita. - O Ninho da Égua – inédita. - O Fogo Corredor – inédita . - Ensaios Inéditos: - Os Horizontes do Itambé (pesquisa sobre a cultura popular de Minas Gerais). - Mosaico Mimético. - Picles Dietéticos e Grãos de Pólen. Poesia Inédita: - A Janela dos Anos. Contos Inéditos: - Dois Patinhos na Lagoa. - Os Contos do Apocalipse Clube. - Os Bigodes de Quintino Bocaiuva. Romances Inéditos: - Tentação Noturna. - Barra Funda – A Evaporação dos Paradigmas. - Sozinho e Mal Acompanhado. - Cantagalo – A Bacia das Almas. - Roda Pião – O Pião Entrou na Roda. - O Dia do Casamento. - Monólogo e Pranto. - Chamando Urubu de Meu Louro (em preparo). Participação em filmes de curta-metragem: - Arvore dos Sonhos, direção de Carlos Augusto Calil; - O Verde Mais Antigo, direção de Osvaldo André de Mello. Colaboração ininterrupta na imprensa divinopolitana desde 1966 - praticamente em todos os jornais que circularam e circulam na cidade até os dias atuais, através de resenhas, comentários, entrevistas, poemas, artigos e crônicas. Colaboração também em muitos jornais e revistas de Belo Horizonte, do Rio e de São Paulo, além de algumas no Uruguai e na Argentina, além de manter um blog literário (http://lazarobarreto.blogspot.com).

terça-feira, abril 05, 2011

TOQUES E RETOQUES

Aécio Neves define todo um estado de coisas no País, ao dizer que “o PT tem uma visão diferente da nossa. Nós achamos que um partido político tem que estar a serviço do País. O PT acha que o correto é colocar o País a serviço de um partido político”. - Arrivismo é isso aí. O cara quer vencer na vida a qualquer custo, vendendo a própria alma, ignorando qualquer escrúpulo. É assim que a honra vai para o brejo. É preciso garantir uma “boca” no serviço público para um novo “companheiro”? Ah, é só criar uma Secretaria ou um novo Ministério.... Contradições absurdas na Educação. Cláudio de Moura e Castro discorre em artigo na revista VEJA sobre o descaso brasileiro nos importantes quesitos do ensinamento e da aprendizagem. Israel, com uma população de apenas 0,2 da mundial (mais ou menos a mesma da cidade de São Paulo), tem um ensino tão primoroso e afeiçoado que seus doutores em várias especialidades já arrebataram 128 prêmios Nobel (cerca de 20% de todos os premiados em toda a histórica vigência do Prêmio). Isso por que? Porque lá o estudo é levado a sério pelos pais e pelos filhos, pela sociedade, pelo governo. Assim falaram Emerson e Goethe, dois expoentes da civilização: “O grande homem é aquele que, no meio da multidão, mantém com perfeita doçura a independência da solidão” (Emerson).... “O começo e o fim de toda atividade literária é a reprodução do mundo que me cerca por meio do mundo que está dentro de mim” (Goethe). - O leitor e o escritor. Ler (hábito gostoso) é melhor do que escrever (hábito penoso). São duas pessoas na mesma pessoa, que precisam uma da outra para se orientarem. Fico às vezes pensando no malabarismo de quem gosta de ler e não gosta de escrever. Creio que essa é uma pessoa condescendente, até mesmo feliz, sendo mais objetiva do que subjetiva. - Avançar na lua pensando que é um queijo. A obesidade no País já virou uma epidemia? A pesquisa do IBGE revela que 50% dos homens e 48% das mulheres brasileiras estão com o peso acima do ideal O pior é que o fato não implica apenas a questão estética: é a saúde do corpo e do espírito que fica comprometida. Urge uma campanha que possa influenciar as pessoas contra esse desvio de conduta orgânica? - O ser humano consciencioso que acessa muito os instrumentos da mídia deve andar enfarado de ver a figura repetitiva de uma mulher esquisita, que não tem porte nem compleição de mãe nem de filha nem de esposa nem de irmã: uma presidente da república, apesar dos pesares. Quem votou e elegeu essa senhora não está nem aí para as consequências, não é mesmo? Mas quem não votou deseja, sinceramente, que ela se torne sensível, inteligente, simpática, e seja (como num passe de mágica) mãe para o povo, uma filha amável, uma esposa idem, uma irmã nossa de todo dia, mirando-se no espelho dos verdadeiros estadistas que fazem da vida e do mundo um momento e um lugar saudáveis. - A literatura no Brasil é uma história muito mal contada. Uma cruz que sacrifica seu portador, quando devia ser uma bandeira florida ou um galho repleto de frutos saudáveis a engalanar e justificar seu portador. Lembro-me que na infância, em alguns momentos das tardes de alguns dias eu via do quintal de nossa casa os anjos e os demônios terçando armas lá nas nuvens altíssimas, em revoadas solenciosas. Via também vassouras voadoras levando as bruxas, os feixes de palavras caindo no arvoredo estremecido, quase abismado. - Lya Luft tem toda razão quando diz que “com o ensino cada vez pior – e ainda por cima sendo mais difícil conseguir uma reprovação -, temos gente saindo das universidades quase sem saber coordenar pensamentos e expressá-los por escrito, ou melhor: sem saber o que pensar das coisas, desinformados e desinteressados de quase tudo. Fico imaginando como será em algumas décadas”. Haja Deus, como diria o Chico Anísio.

sábado, abril 02, 2011

RIO PARANAIBA (*)

 À poeta Lacyr Schetino. Uma noite (ou um estranho dia) cobria de ervas e detritos as betoneiras e guindastes que ameaçavam cobras e lagartos. Seria maio? Agosto? Trinta mil olhos de formigas testemunhavam o meu pavor de ver o rio levar a lua, que se agitava, que gritava, que chamava minha atenção atônita, ineficaz. Entrementes ouço dizer que há répteis úteis e nocivos, que o diabo fez a ponte pênsil, que os cães não atacam pessoas nuas, que todos os brasileiros têm os olhos castanhos, e que a solidão...

(*) Transcrito da página 17 do livro de poemas “Arvore no Telhado”, edição do Movimento AGORA, Divinópolis, MG, 1969).

DOIS, TRÊS POEMAS (REVISADOS)

1 – O Mineral País de Itabira. A boa chuva de versos semeando adeuses e caminhos. O poente em profundas manhãs. E todo o universo mineireiro das chapadas e alterosas da elegia continental cultivada aqui, ali, acolá, para remeter aos diversos brasis do Brasil. Ele, o longo homem sóbrio, canta ao ritmo torrencial das enxadas na roça de milho um choro em círculos de ecos naquele mineral país de Itabira - hoje alma da montanha derretida, que se faz rio imaginário em paráfrases intermináveis. E assim tudo se baralha: um diabo de escorpião no bolso intercepta minhas palavras e trocas as possíveis respostas dos ouvintes e leitores. 

 2 – Os Três Nomes do Gato (*). Dar nome aos gatos não é tarefa fútil nem fácil. Muitas vezes quando digo que o gato tem TRÊS NOMES DIFERENTES, as pessoas olham-me de novo, julgam-me biruta. Mas assim é, por mais que estranhem e gozem! Primeiro o nome corrente, de uso da família, que pode ser Poetinha, Alípio ou Conceição. Depois o escolhido de pessoas refinadas (extravagantes ou mesmo sóbrias), como Menelau, Polonaise ou Pixinguinha. E por último o nome mais íntimo e solitário, que ele mais necessita para manter seu orgulho e esticar os bigodes, enrodilhar-se na cadeira ou até mesmo pular o muro como num vôo - e que pode ser Diadorim, Caracóia ou Ana Lívia Plurabelle, nome que nenhum outro gato deste mundo ostenta. Mas além desses e acima de tudo e de todos há um nome especial a preferir e esse ninguém sabe ou saberá. É o nome que nenhuma pesquisa humana pode descobrir e que só o próprio gato sabe, mas que nunca revelará a ninguém. Assim, se ver um gato em profunda meditação, os olhos abertos mas cegos, as unhas em inocente repouso, a razão é sempre a mesma: a mente dele está ocupada na contemplação de seu profundo e inescrutável e singular NOME. 
 (*) Paráfrase de um poema de T.S.Eliot. 

3 – Lírios. Beleza é loucura. A confluência do périplo de Orfeu no espelho triangular das vozes líricas. Beleza é tragédia. A claridade excessiva é absoluta cegueira. E que deserto é a metafísica visual.