UM DE NOME MÁRIO
Na edição do dia 25/09/1977 do saudoso “Diário do Oeste”, de nossa cidade, no qual eu mantinha uma coluna de Fatos e Comentários, publiquei: “poeta da realidade cotidiana, Mário de Oliveira não se deixou afligir pela pesquisa formal, não quebrou cabeça nos labirintos visuais nem se quedou exausto e exangue na ânsia infrutífera de inventar novas técnicas e novas linguagens. Escrevendo como quem vive e assume, vivendo e assumindo as condições de seu espaço, ele não só encontra quase todas as soluções de linguagem, como reabilita para além do bafafá teórico o discursivismo poético”. Sem querer confrontar a forma com o conteúdo, o que vi na poética do Mario foi a naturalidade sobrepondo-se à artificialidade, a simplicidade à pirotecnia, assim conseguindo, sem dor e sem empáfia, o poema incólume e airoso, perfeitamente contextualizado na estrutura dramática de nossa existência ao mesmo tempo relativa e absoluta, terrena e cerúlea. Agora ele está de livro novo na praça, com o “AQUI BEM PERTO” (Edições Galo Branco, Rio de Janeiro, RJ, 2008), 155 páginas de poemas escolhidos em outros seis livros publicados a partir de 1969, quando participava de nossos tablóides e jornais literários divinopolitanos. Dele posso garantir que é poeta de tempo integral e não apenas quando está nas mãos da poesia, com as mãos nos poemas. É uma pessoa literalmente poética, na qual as experiências e convicções materiais do dia-a-dia da vida comum interligam-se às dos planos imateriais, fundindo idéias e sentimentos no mesmo rol do equilíbrio vital. O livro sai agora, num dos intervalos de seu pujante e criterioso trabalho do levantamento biográfico do indelével Casimiro de Abreu, poeta das imorredouras primaveras da vida e do mundo. É um livro de poemas escolhidos, todos bons, ótimos e algumas verdadeiras obras primas – todos impregnados da doce ternura de sentir demoradamente o que demoradamente vê. Não canso de ler o poema que escreveu sobre a mãe: “Uma de Nome Emília”, na página 41, bem como o que escreveu a respeito de si mesmo, na página 49, com o título de “Um de Nome Mário”. Assim, fazendo pausas para respirar e suspirar, vou lendo e relendo os poemas das páginas 16 (“Esse Que Passa”), 19 (“Recortes do Inconfidente”), 33 (“Caymmy”), 57 (“Penélope”, generosamente a mim dedicado), 65 (Retorno”), 73 (“Poema seco”), 81 (“Dois Zero Oito”), 77 (“Fazenda das Coiranas”), 85 (“Bílis”), 89 (“Do Lavrador” – e da página 145, “Solidão”, esta maravilha: A solidão foi sempre a minha sina, melhor dizendo, eu mesmo a escolhi. Sempre gostei da própria companhia, e assim, a sós comigo, eu vivo aqui. Quem faz tão bela casa, a si se basta, sabe moldar o mundo a seu contento. Olho ao redor de mim: nada me falta. Se acaso me faltar, eu mesmo invento. Impossível é deixar de citar as perolas das páginas 122, 120 e 111, respectivamente: “Da Fábrica”, “Supermercado” e “Ouvindo Mahler”. Deixei para o final destas observações sobre o livro, a comovente homenagem que ele faz à esposa (na verdade e na beleza, um amor de criatura). O poema tem o título simples: “Ela, a Minha Mulher” – mas o leitor poderá ver e sentir como é se estivéssemos diante da admirável Dona Zezé: Ela não bate à porta, não precisa, como Irene no céu, pedir licença: transita livre pela minha vida, doce e suave, lúdica presença. Transita leve. E não levita nunca, sabe sonhar sem se soltar do chão. da minha parte, que sou dado à fuga, levito sempre, e pouso em sua mão.